23.1.19

História sobre uma história: a estrela de rock and roll que tomou cocaína para engatar uma hospedeira


Underworld & Iggy Pop, “Bells and Circles”, in https://www.youtube.com/watch?v=bd6aJ35UTP8
A estrela de rock and roll atira-se ao fascismo higiénico que proibiu o tabaco dentro dos aviões. Nostálgico, evoca “os anos de ouro da aviação comercial”, quando a aviação ainda não tinha sucumbido aos dogmas do fascismo higiénico e o ar dentro de um avião era uma imensa nebulosa que fundia o fumo de cigarros variados. Até se lembra quando os passageiros encontravam cinzeiros nos braços dos bancos. Agora, voar é um aborrecimento. Tudo hermeticamente higiénico e, todavia, o ar artificial dentro dos aviões continua nefasto para a saúde. Em contrapartida, as pessoas mais nervosas não se podem refugiar no efeito calmante do tabaco.
A estrela de rock and roll lembra-se de um voo em que ficou siderado com a beleza de uma hospedeira. Como a descreveu, uma mulher alta, arquétipo da beleza americana. Para ganhar coragem para meter conversa com a hospedeira, desembrulhou um grama de cocaína e consumiu-a já com os cintos apertados. Era para libertar o verbo e derrotar a inibição. Algo não bate certo: faz parte do imaginário, uma espécie de mito urbano (sem a parte do mito), que as estrelas de rock and roll não esbarram em dificuldades quando fazem adejar o charme sobre o sexo feminino. Em regra, um estalar de dedos garante uma conquista. A estrela de rock and roll teve vergonha. Talvez refém da sua feiura, ou considerando-se uma pessoa desinteressante, socorreu-se de um estimulante para desbloquear a vergonha. Ou então, meter conversa com a hospedeira lúbrica foi o pretexto para consumir um grama de cocaína antes de o avião levantar voo.
A estrela de rock and roll conta a boa notícia: a hospedeira anuiu e escrevinhou, à pressa, o número de telefone num papel, entregando-o em mão à estrela de rock and roll. Depois, a má notícia: inebriado pelos efeitos psicotrópicos da substância inalada, depois de aterrar, e talvez já em si, deu conta que tinha perdido o papel onde estava escrito o número de telefone da bela hospedeira. Arrependeu-se, já a destempo: a cocaína não era melhor do que a hospedeira – atestou a estrela de rock and roll. Literalmente, ficou a ver aviões.
(Altura em que feministas abespinhadas se insurgiriam contra o topete de comparar uma mulher com cocaína, protestando contra a “mercadorização” da mulher. Ou, como no poema de Ana Luísa Amaral (“Incomparáveis receitas”), “Dizem que não se deve comparar humano/a coisas ou sabores.”)
A estrela de rock and roll escorregou para a especulação gratuita. Como pode o músico dar por adquirido que a cocaína era pior, se não chegou a conhecer a hospedeira? A estrela de rock and rollter-se-á arrependido de ser tímido. Ou então, de ter arranjado um pretexto para desembrulhar um grama de cocaína antes de o avião levantar voo. A cocaína teve as costas largas.

Sem comentários: