Deste chão que não deu uvas, uma aurora boreal. Das suas pedras que se remexem com a ajuda do vento infame, a esteira onde se reinventam os rostos. Deste chão, o negrume que desmotiva e, contudo, as páginas são levantadas contra as intempéries do entardecer. Deste chão garabulhento, paredes-meias com as alcáçovas do medo, o estirador dos queixumes. Deste ao chão o teu nome proscrito. Deste-lhe uma página proibida no atlas da memória. Deste a vurmosa sela que não fabrica mentiras. Deste chão atirado ao chão, levantam-se os vultos sencientes que devolvem claridade ao dia timorato. Deste chão, sem derruir a redenção, insurge-se o comodato das almas permeáveis. Tão permeáveis quanto a matéria couraçada que dá corpo ao chão. Deste chão que não deu uvas avivou-se o luar na contrafação da luz caiada. Deste chão não foram uvas que vieram ao regaço: foi o amanhecer da fala em cachos sobrepostos, as sílabas alinhadas num socalco de fino recorte. Este foi o chão que nunca deu uvas, o chão de que não se esperam vindimas. O chão que vindima as aleivosias emolduradas em bocas dolosas, devolvendo-as aos despojos. Deste de ti ao chão na probabilidade de ele se embeber em tua fertilidade. Soubeste que foi empreitada em vão. E nem assim esmoreceste. Pois soubeste, de um chão de basalto que não deu uvas nem outro fruto qualquer, que não era de esperar o ato heurístico. Não se esperava que lençóis freáticos amparassem o chão; mas a água não conseguia abrir a escotilha do chão blindado – não conseguia se não ser água freática. Contudo, não vieste embora no vilipêndio da angústia. O chão pode não dar uvas, mas habilitou a geografia com paisagens hostis e belas. Não é todos os dias que um paradoxo medra em síntese tão rendosa.
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