17.2.04

Durão Barroso, Ferro Rodrigues e o destino do Pacto de Estabilidade e Crescimento

Os primeiros-ministros de Portugal, Espanha, Itália, Holanda, Polónia e Estónia redigiram uma carta ao presidente do Conselho Europeu. Apelam a um cumprimento escrupuloso do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), argumentando que o pacto é “um elemento essencial da governança económica da nossa União Económica e Monetária e uma condição necessária para o crescimento económico sustentado que todos prosseguimos. As suas regras deverão ser aplicadas consistentemente e numa base não-discriminatória”.

Aparentemente, trata-se de uma iniciativa que merece todos os encómios, por tentar esbater a desconfiança dos cidadãos ao saberem que a França e a Alemanha escaparam às sanções previstas no PEC. Apesar dos elogios, tenho dúvidas acerca da eficácia da carta. Alguns dos Estados membros que subscreveram esta carta não são o exemplo de países interessados num escrupuloso respeito do pacto. Tal será o caso de Portugal e da Itália, países que estão com a corda na garganta em termos da disciplina orçamental exigida pelo pacto. Faria sentido que estes países se aproveitassem da oportunidade criada pela França e pela Alemanha para aliviarem o cinto apertado, porque já não seriam penalizados – como o não foram a França e a Alemanha – por um défice excessivo.

No entanto, é necessário ir mais longe na análise das palavras contidas na carta. Quando os proponentes reclamam que as regras do PEC “deverão ser aplicadas (…) numa base não-discriminatória”, para Itália e Portugal esta afirmação deve ser entendida da seguinte forma: se a França e a Alemanha viram os seus défices excessivos perdoados, por maioria de razão também o deslizamento orçamental destes dois países mediterrânicos será merecedor do mesmo tratamento. O significado é diferente quando encarado na óptica dos governos espanhol e holandês. Ambos os países têm respeitado o clima de disciplina orçamental. Eles têm todo o interesse em que as regras do PEC sejam respeitadas sem qualquer interpretação sinuosa que, na essência, corresponda à sua desvirtuação. Só assim podem impedir que os maus alunos sejam premiados (por escaparem às sanções). Portanto, entre os subscritores da carta não existe coerência interna quanto à interpretação daquela frase, o que condena à nascença o sucesso da iniciativa.

As ondas de choque fizeram-se sentir na política doméstica. Ferro Rodrigues apareceu visivelmente incomodado com a participação do governo português. Compreende-se a reacção. Será uma forma de passar a esponja pela gestão caótica das finanças públicas dos governos de que ele também fez parte. Por outro lado, se é verdade que Sousa Franco vai ser o cabeça de lista do PS nas eleições para o Parlamento Europeu, há que criar as condições para que o resultado eleitoral dos socialistas não surja manchado pelas responsabilidades que esta personalidade teve no deslizamento das contas públicas nacionais. Ainda na semana passada foram várias as vozes que ergueram o dedo acusador a Sousa Franco. Teria sido ele, enquanto ministro das finanças, o verdadeiro responsável pela situação de descontrolo que foi herdada pelos seus sucessores.

Lamento que os políticos continuem a ter vistas curtas. Que privilegiem uma agenda própria que se divorcia dos interesses do país. A Ferro Rodrigues e ao actual PS interessa uma linha orientadora das finanças públicas que sublinha o papel das despesas públicas como instrumento vital para o crescimento do país. Ainda que esta visão seja cada vez mais questionada por mais e mais economistas, o PS agarra-se a esta tábua de salvação para mascarar a sua incompetência pela gestão passada. Mantém-se fiel a esta postura, ainda que ela seja a que piores consequências traz para o país.

1 comentário:

Anónimo disse...

Aprendi muito