19.2.04

Um novo triunvirato para a União Europeia?

Os líderes da Alemanha, França e Reino Unido estiveram ontem reunidos em Berlim. Em cima da mesa estiveram propostas para revigorar a União Europeia (UE). Depois da pequena crise que a UE atravessa devido aos resultados inconclusivos sobre a Constituição da União Europeia; e depois da crise de credibilidade motivada pelo não cumprimento das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento; compreende-se que três dos maiores países da União tenham sentido a necessidade de chamar a si a iniciativa. Para surgirem aos olhos da opinião pública como as novas locomotivas que querem imprimir o rumo e a velocidade da UE.

Alguns Estados membros não se coibiram de criticar em público a iniciativa, temendo que um novo directório esteja a tomar forma e venha a impor unilateralmente os seus interesses aos demais Estados membros. No entanto, esses temores não têm razão de ser.

Primeiro, as alterações de maior impacto carecem de unanimidade. Ora, estamos a falar da vontade de três Estados membros, à qual tem que se adicionar a concordância dos restantes doze. Se alguns Estados membros não aceitarem as alterações propostas pelo triunvirato, têm uma poderosa arma de arremesso para contrariar a sua aplicação – o poder do voto.

A ideia de um triunvirato dominante dilui-se no processo formal de voto e nas manobras informais que tentam cativar aliados. Através de ambos os mecanismos, a existência de um directório é materialmente impraticável. É impossível que três Estados membros imponham a sua vontade contra os restantes doze. Outra coisa, bem diferente, é a necessária captação de apoios para que as propostas do triunvirato tenham vencimento. Quanto mais Estados membros se vierem a colocar ao lado das propostas gizadas pelo triunvirato, menos o rótulo de directório faz sentido.

Segundo, não se pode ignorar o historial da integração europeia, essencialmente construído através de iniciativas de grupos restritos de Estados membros. Exibir repulsa pela iniciativa de Berlim é ignorar o passado da integração europeia, ou manifestar um serôdio oportunismo de criticar apenas por se ter sido colocado à margem das negociações.

Uma outra forma de erguer o dedo acusador à reunião de Berlim desvia-se para o subjectivismo. Podemos corporizar um sentimento de desconfiança devido às personalidades envolvidas na reunião. Todos são líderes nacionais sem carisma. Pior ainda, são líderes que não se distinguiram por uma visão consistente sobre o devir da União Europeia. São pessoas a quem não se conhece uma adesão franca e descomprometida ao ideal da integração europeia. Por mais do que uma vez, não hesitaram em colocar os interesses particulares dos respectivos países à frente do interesse comum – ainda que isso supusesse violar regras que obrigam todos os Estados membros. Ainda que, dessa forma, se furtem às suas especiais responsabilidades.

De forma alguma podemos comparar Schröder, Chirac e Blair com Köhl ou Mitterrand, sem os quais a União Económica e Monetária não teria nascido no tempo e da forma que nasceu. Pelo mau exemplo que os líderes britânico, alemão e francês representam para a UE, aí sim se filia a desconfiança em relação à reunião de Berlim. Porque se trata de personalidades erráticas, não podemos ter a certeza para onde eles querem conduzir a UE.

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