17.7.08

Os psicólogos teimam em simplificar a complexidade do ser humano


A pessoa é muito complexa. A genética está aí para o demonstrar, com os mapas genéticos que revelam arrevesados ADN. Não há dois seres humanos iguais, apesar de sermos tantos a povoar o mundo. Os psicólogos persistem em arranjar gavetas onde metem as pessoas. Porventura como método que lhes facilita o estudo da mente humana. Será apenas um instrumento para a sua particular ciência? O paradoxo está aqui: da tremenda complexidade da mente humana, passando pelas tentativas de (digo eu, artificial) simplificação feita pelos psicólogos, por sua vez gente com uma cabeça muito complicada. E como é que gente tão complicada se aventura a decifrar a complexidade do ser humano?

Agora descobriram que só há seis maneiras de amar: “romântica, altruísta, lúdica, pragmática, cooperativa e possessiva”. Desta vez ensaiaram rótulos em algo tão complexo – ou porventura simples demais para ser assim teorizado – como o amor. Gostava de ver um poeta confrontado com a tentativa muito científica de colocar dísticos no amor. Os poetas são exímios na celebração do amor. Conseguem, como ninguém, descobrir palavras que são a sagração do amor. A negação da proclamada cientificidade que os psicólogos julgam encontrar nas mil e uma formas de amor, por eles arrumadas em seis categorias seis. Aposto: um poeta indignado com a banalização do amor depois deste fruste exercício de simplificação dos psicólogos. Da indignação viria pelo punho do poeta um satírico poema, as estrofes implacáveis para a soberba dos psicólogos.

Uma interrogação irrequieta: uma categoria exclui outras? Quando amamos, só o fazemos de uma daquelas formas? Há a possibilidade de um rótulo ser complementar de outro? Por exemplo, uma pessoa pode ser no amor altruísta e, ao mesmo tempo, cooperativo? É aqui que convém ir à fonte e resgatar as definições para encontrar solução para a interrogação.

Descobriram que o “amor altruísta” é aquele em que os que amam se anulam “perante o outro, tendendo a isolar-se num mundo onde, na sua imaginação, só cabem os dois ainda que o outro pense e actue exactamente ao contrário”. Como há tempo ouvi da boca de um pastor evangélico (em celebração de um casamento para que fui convidado), o amor é sacrifício; é, nas iluminadas palavras do pastor, quando a mulher se sacrifica pelo homem porque este a ama. (Não havia feministas no templo evangélico: nenhuma senhora ou menina se coçou naquele instante.) Do estudo dos eminentes psicólogos aprendemos que o “amor cooperativo” “geralmente nasce de amizade anterior e antiga e é alimentado por hábitos e interesses comuns”. Portanto, não é parecido com a forma altruísta de amar. Diria, é o amor em que cada um funciona como a muleta do outro. Um remédio. Um remendo.

Se assim é, não estaremos em presença de uma forma pragmática de amar? É só recuperar a definição de “amor pragmático”: é o que acontece com “pessoas práticas, disciplinadas e disciplinadoras, com uma educação, por vezes, austera, que podem minimizar ou reprimir o sentimento, não sendo dadas a manifestações expressivas de carinho”. Também é diferente. No amor cooperativo, cada amante tem um comportamento pragmático: à falta de melhor, lá terá que ser aquele(a), o primeiro a vir à rede. Para os psicólogos estudiosos do fenómeno, o dito “amor pragmático” é o que pertence aos que têm um coração granítico, aqueles em que a manifestação do sentimento esbarra numa esfíngica pose.

E depois ainda temos direito ao “amor lúdico” – uma derivação do pragmatismo? É o que se identifica com a “conquista e a busca de emoções passageiras e é muito frequente em jovens adultos, em especial homens”. O engate puro e simples. Mas, o engate é amor? Afinal o que é o amor? Não é antes, de acordo com a gaveta do “amor romântico”, aquele que “envolve paixão, unidade, atracção sexual, aparecendo na adolescência e ainda provoca casos de perdição e em caso de fracasso ainda pode levar ao suicídio”? Mas se tem estas características, o amor – esta categoria de amor não é uma patologia? Se o amor é coisa boa, não pode ser compatível com uma doença. Mas se as pessoas se encaixarem no dito “amor possessivo” é porque são determinadas “pelo ciúme [que] provoca emoções extremas e comportamentos obsessivo-compulsivos”, exigindo do outro “constante atenção e em momentos de crise prejudica a vida familiar e profissional”. Isto também não é doença? Estou confuso!

Tenho uma dúvida, diria, metódica. O estudo dos psicólogos resulta da observação dos comportamentos, o que supõe uma de duas coisas: ou vasculhar na intimidade das pessoas (hipótese que descarto), ou o convite para responderem a inquéritos que retratam a sua forma de amar. E se as pessoas interpretam mal as perguntas? E se as pessoas julgam amar de uma forma, quando afinal a sua representação exterior revela outro tipo de comportamento? Este estudo pode ter a utilidade do nada. Até porque o amor não se categoriza. O poeta diria: o amor é uno.

1 comentário:

Unknown disse...

Nossa, amei esse blog. Gente, que de mais!

Gostei muito dessa explicação sobre o amor,esses psicologos realmente são bons mesmo hein?


Beijos.
Que Deus abençõe vocês.