15.4.09

Pena que não haja eleições todos os anos…


Ninguém inventa a pólvora nisto da gestão cuidadosa do ciclo eleitoral. Ninguém descobre a pólvora ao reparar na orgia de medidas que mais parecem rebuçadinhos atirados para a boca dos eleitores em véspera de importantes eleições. Não foram os incompetentes que nos governam que descobriram essa pólvora, decerto. Há-a por todo o lado onde haja eleições. É quando eleitoralismo e demagogia andam de braço dado.


Só nas últimas semanas, entre a bebedeira de medidas de última hora só para que os eleitores se encantem com a elevada proficiência do governo do "engenheiro", o meu bolso foi agraciado com duas: a devolução do IRS só vai demorar um mês; e a isenção do imposto municipal de imóveis (IMI) foi prolongada por dois anos.


Qual é a primeira reacção do eleitor desatento? Que governo tão generoso! Ainda por cima, nestes tenebrosos tempos de crise em que o dinheiro escasseia (já lá vou), sabem bem estes rebuçadinhos! Já não é preciso esperar meses a fio para que o fisco devolva o dinheiro do IRS que ficou retido do lado de lá. A malta dos impostos deve andar a fazer horas extraordinárias para a devolução do IRS ir parar às contas bancárias um mês após a entrega da declaração de rendimentos. Isso, ou contrataram um génio da informática que agilizou o processo de liquidação dos impostos de tal maneira que chega um mês para fazer o acerto de contas com os contribuintes. Que agradecem, penhoradamente.


O outro exemplo: em vez de seis anos, os loucos que se empenharam até ao tutano e por uma vida inteira para serem proprietários de uma modesta casa tiveram a boa nova de saberem que só ao fim de oito anos serão obrigados a pagar IMI. A boa notícia seria evaporar este imposto que é uma abjecção. O IMI significa isto: para sermos proprietários de uma casa temos que pagar uma verba anual à autarquia onde a casa está localizada. Ter casa é crime tão hediondo assim? Sempre dirão os da habitual condescendência com o socialismo em acção: quem não quer ser proprietário, só para não pagar este imposto, que seja arrendatário. Sim; se ao menos houvesse mercado de arrendamento decente.


Aos efeitos práticos destas medidas carregadas de fanfarra eleitoralista. Primeiro, é notável a coincidência de, em ano de eleições, se descobrir maneira de tornar expedita a devolução do IRS. Apetece tanto perguntar: e por que não era possível, em anos anteriores, devolver o IRS logo ao fim de um mês? São as notáveis coincidências, cirurgicamente agendadas para ano de eleições, como se estes esboços de governantes fossem encantadores de serpentes no uso da mágica flauta que hipnotiza o réptil. Segundo, o prolongamento da isenção do IMI apenas favorece aqueles que neste ano já teriam que abrir os cordões à bolsa. Para os demais, é apenas um mirífico balão de oxigénio. Não é boa notícia nenhuma, pois se não é mais cedo é mais tarde que vão abrir os cordões à bolsa. A boa notícia seria a extinção deste absurdo imposto – mas isto sou só eu a sonhar utopias impossíveis num chão que transpira a socialismo.


Tinha ficado em promessa lá atrás: dizem-nos que estes rebuçadinhos em véspera eleitoral se justificam por causa da crise e da escassez de dinheiro nos bolsos das famílias. Em que ficamos? Um moço de recados, o governador do Banco de Portugal, anda para aí a repetir que a crise terá o milagroso efeito de espalhar mais dinheiro nos bolsos dos cidadãos. Depois a prédica do governo do "engenheiro" afina por um diapasão diferente: falta dinheiro, venham daí alívios fiscais para o desafogo das famílias. Portanto: alguém anda a mentir.


O povo desatento terá a tentação de dizer, enquanto se desfaz em agradecimentos ao generoso "engenheiro", que é pena que não haja eleições todos os anos só para esta generosidade se repetir amiúde. Eu, mergulhado num tremendo mau feitio, porventura até preso a uma ingratidão que não se recomenda, nem assim darei o meu voto ao "engenheiro" e sua seita. Prova de que o eleitoralismo em comandita com a demagogia não consegue enfeitiçar toda a gente. Só cai quem anda distraído. Ou quem quer cair na esparrela.

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