21.9.10

A direita que aferroa


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Quando uma certa direita descamba para o populismo barato: ele é o referendo sobre questões de segurança, ele é a água benta às deportações de ciganos ordenadas pelo companheiro Sarkozy, ele é a exortação para fiscalizar as lojas chinesas como via de combater a “concorrência desleal”. Estes são os cartoes de visita de Paulo Portas e do actual CDS-PP, no seu esplendor populista.
E depois olhamos para o lado de lá, por onde há as esquerdas variadas, e há quem veja naquele partido o bastião da extrema-direita. Não é que não seja intrigante que as luminárias esquerdistas se esqueçam do genuíno partido da extrema-direita – o PND – pois este não chega a fazer cócegas eleitorais. Quando muito incomoda quando aparece nos jornais ou nas televisões a destilar saudades da ditadura que fomos há não muito tempo. O problema desta direita conservadora e que frequentemente escorrega para um populismo conveniente (porque arregimenta votos entre gente atamancada na sua pequenez mental) é que, com causas destas, põe-se a jeito do rótulo que não gosta: “extrema-direita”.
Eu acho que não. Num contínuo que vai de uma extremidade à outra da paisagem política, o lugar é ocupado pelo sinistro PND. É evidente que os partidos que repartem a esquerda e a extrema-esquerda apreciam a conotação e encostam os democratas-cristãos (ou conservadores, ou populistas – depende dos dias e dos humores) à extrema-direita. Diria que é de uma conveniência táctica: ou para retirar eleitorado ao CDS-PP, ou para o enquistar a franjas pouco recomendáveis, os saudosistas do passado salazarento. E o pior é que os estrategas (ou Portas em pessoa – a hipótese mais provável) voluntariamente se entregam ao anátema pespegado pelas esquerdas e extremas-esquerdas, caindo que nem anjinhos. Das duas, uma: ou a ideia não é incomodativa para Portas e seguidores, ou a ingenuidade abunda lá pela sede do partido. Se a primeira hipótese se confirmar, temo que a extrema-esquerda esteja coberta de razão quando coloca o CDS-PP na extremidade que está nos antípodas da sua própria extremidade.
Acostumei-me a chamar a esta direita a “direita conservadora” (ou “direita de sacristia”, ou “direita bafienta”). As bandeiras recentes que escolheram como prova de vida destapam um qualificativo alternativo: a direita bulldog. A do pulso forte. Devem ter lido sofisticadas análises sociológicas que identificam a propensão da maioria para a governação com mão de ferro. Há ali um complexo de Édipo mal resolvido – Salazar a figurar no papel de Édipo. O exagero vai ao ponto de haver votantes (socialistas e não socialistas) do socialista primeiro-ministro que lhe gabam o mesmo atributo, quando o homem, coitado, metido nas setes varas das suas limitações intelectuais, confunde autoridade com autoritarismo.
É nestas alturas que desconfio que ainda não amadurecemos, enfiados num atavismo civilizacional. Se o povo gosta de chicote (de dar e receber), certos políticos engenhosamente pegam na plasticina das propostas e fazem a vontade ao soberano povo. Se o povo quer castigos aos meliantes, referende-se a mal-amada justiça para a tornar mais punitiva. Se Sarkozy decidiu que os ciganos fazem mal à sempre grandiosa França, empunhem-se solidariedades partidárias, nem que através delas ecoem do passado purgas étnicas que deram tão mau resultado. E como o povinho detesta os chineses e desconfia do furor das respectivas lojas, persigam-se os comerciantes chineses, nem que seja uma perseguição que tresanda a cirurgia étnica.
E eu que me sei de direita, sinto uma profunda vergonha desta direita tacanha. O mal está na alergia que temos aos valores liberais. Se não, uma direita liberal já se tinha aqui erguido.

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