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É grande o alvoroço noutra guerra de alecrim e manjerona entre os partidos do bloco central. O do governo faz uma chantagem descarada sobre o da oposição: eles devem abençoar o orçamento para 2011, ou é o caos em perspectiva. O da oposição põe-se em bicos de pés e ameaça não aprovar o orçamento. Tenta jogar um trunfo que cerceie a irresponsabilidade dos que já se demoram no governo. No meio deste esgrima de pequenez partidária, o presidente anda preocupado. Tem que estar tudo calmo para a sua reeleição não ser hipotecada.
Vai daí, o presidente afirmou estar convencido que o orçamento vai ser aprovado. Em jeito de puxão de orelhas antecipado aos contendores. Nas entrelinhas, sua excelência avisa que seria terrível se o orçamento para o próximo ano não for aprovado. As responsabilidades cairiam sobre os dois maiores partidos, assim condenados ao entendimento. Sua excelência teve outra frase lapidar que engrossa o receituário do “carneirismo” nacional: devemos pôr as diferenças de lado e pensar todos da mesma forma.
Primeira anotação: esta exortação do presidente da república contém uma clara discriminação. Quando se refere a “todos” está a pensar na gente muito responsável, desprovida de radicais pontos de vista, que orbita na paisagem do bloco central. Sabe que não consegue o ámen da extrema-esquerda e dos que se situam na direita liberal. Não deixa de ser discriminatório, ainda que, mensurados pelo termómetro das preferências eleitorais, aquelas franjas não ultrapassem 20-25%. A bota deve condizer com a perdigota. Sua excelência devia ser mais claro no discurso. “Todos” significa todos, sem excepção. Se sabe que alguns (e não são poucos) jamais engrossarão a maré dos consensos em nome da pátria, devia rever o discurso, deixar cair a palavra “todos”.
Segunda anotação: como em tudo na vida, às vezes é preferível o nada a um mau resultado. Uma coisa manifestamente má é destrutiva por natureza. Provoca ondas de choque que pioram o diagnóstico. É como tomarmos o remédio errado quando andamos às voltas com um achaque: não cortamos o mal pela raiz (o achaque persiste) e, ainda por cima, outras maleitas tomam lugar no organismo. A coisa manifestamente má produz resultados piores do que a ausência de coisa alguma.
Alguns profetas da desgraça andam por aí a antecipar pavorosos cenários caso não haja orçamento com a água benta do bloco central. Que mau seria vivermos em duodécimos à base do actual orçamento – advertem em tom alarmista. É um mau começo: a confissão de que o orçamento actual é uma porcaria. Quando insistem na ladainha que assegura o caos se o orçamento não passar, falta explicar os porquês desse efeito. Alguns adivinham que os mercados desconfiavam e seria mais difícil recorrer a crédito no mercado global (ainda e sempre o crónico endividamento). Numa altura em que andamos exasperados por a recuperação económica demorar tanto, o crédito mais caro seria uma catástrofe. Não acredito que a penalização de quem nos pode emprestar dinheiro aconteça nesses termos, ou por essa razão. Os mercados também sabem diagnosticar a qualidade dos orçamentos dos países. Se ajuízam que o orçamento está pejado de más opções e, pior ainda, que algumas delas perpetuam o endividamento, o risco de nos emprestar dinheiro sobe à estratosfera.
A súmula: um não orçamento nem sempre é pior do que um mau orçamento. Depende das circunstância e da qualidade dos actores do momento. Atendendo a umas e a outros, tudo condiz para que um não orçamento faça menos mal do que o mau orçamento que se adivinha. Mas o pior de tudo é o senhor presidente exortar para que sejamos todos nadadores da mesma maré. O pensamento único, essa monstruosidade.
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