In http://www.lux.iol.pt/internacionais/coronel-assassino-mulher-lingerie-video-insolito/1201309-4997.html
Pintara as unhas dos pés de vermelho puta. Aprendera, em vídeos para aspirantes a cabeleireiros, a aperaltar os pelos das sobrancelhas. Rapara todos os pelos do corpo. E, porém, continuava a envergar o corpanzil másculo, senhor de uma musculatura imponente nos antípodas da feminilidade. Por dentro seria mulher. Por fora, a angústia de carregar o corpo e as hormonas erradas, masculinas. Revoltado, vingara-se nas mulheres que pudera vitimar. O coronel tinha um secreto cadastro de violações encadeadas com assassinatos de mulheres.
O coronel de severa educação militar, treinado para a rígida disciplina mental, sentia um terrível espartilho a amordaçá-lo. Era seu um corpo estranho, o corpo em destempero com os tortuosos corredores da mente. A mortalha da severidade militar era a derradeira gota de água que o faria transbordar as estribeiras.
Eu não sei se o coronel fantasiava com outros fetiches de transformismo. Tomámos conhecimento de uma fotografia em que o coronel aparece vestido com uma lingerie feminina de cor acinzentada. Estranhamente, não exibia um esgar malandro, não espreitava para o espelho pelo canto dos olhos, insinuando uma lascívia que desatasse pensamentos lúbricos em quem fosse excitado espectador da fotografia. Trazia um rosto fechado, angustiado. Nem ao trajar a ambicionada lingerie feminina se libertava das imensas consumições interiores.
Andaria em bicos de pés pela casa depois de pintar as unhas dos pés com verniz vermelho puta? Dormia com uma reduzida, sensual camisa de noite? Ensaiava festas em que era o único convidado, dançando em frente do espelho com um cesto de frutas à cabeça em perfeita imitação de Cármen Miranda? Maneava-se escandalosamente quando saía nu da casa de banho para a cozinha, antes de pegar no secador para ensaiar o enésimo penteado na cabeleira postiça que punha depois de debruar os lábios a batôn roxo?
A casa era o refúgio para a esquizofrenia reprimida do coronel. Era lá que se libertava da insuportável pressão da vida normal que os colegas do quartel imaginavam ser a sua. Chegava a casa e o corpo explodia, apetecia-lhe rasgar a austera farda militar, queimá-la entre os despojos da masculinidade arrependida. Só aproveitava as divisas e as comendas que enfeitavam o fardamento que usava nas cerimónias solenes. Queria resgatá-las das fardas já reduzidas a um amontoado de trapos rasgados, com elas enfeitar a peça de lingerie roubada à última vítima. A peça de lingerie branco pérola ornamentada com os sinais da elevada patente militar para homenagear o covarde feito.
Às vezes, no auge do sobressalto interior que o acossava, ia ao coldre algures largado na alcatifa da sala e tirava a pistola. Acariciava-a, como se fosse um objecto sexual. Demorava-se na estranha contemplação da bestialidade da arma. Repetia o acto de travar e destravar o revólver. Passava o dedo pelo gatilho, ousava premir o gatilho até ao fim para ouvir o ruído seco da câmara interior onde não estava bala alguma. Punha lá dentro uma bala e repetia o exercício, agora com a pistola apontada à cabeça. Lembrava-se de um filme de há mais de vinte anos (“O caçador”) em que prisioneiros americanos no Vietname eram obrigados a jogar à roleta russa para divertimento dos seus algozes. Um desejo irreprimível de imitar o jogo tomava conta de tudo.
Por maior que fosse a angústia que o mortificava, era maior a covardia que impedia que o dedo trémulo premisse o gatilho. Ficava ali minutos sem fim com a arma apontada à fronte enquanto as lágrimas se vertiam, abundantes, pelo rosto. Até um tremendo cansaço tomar conta dele e se deitar nos braços do sono, à espera que os sonhos a seguir fossem um filme com as coisas na sua compostura desejada.
2 comentários:
Vejo que está mesmo a melhorar, aqui está um seu colega que produz mais ou menos os mesmo conteúdos que o Sr. produz ultimamente. Parabens.
http://www.youtube.com/watch?v=lRhDEjH7XzA&feature=player_embedded
Muito agradecido pelo elogio. São admiradore(a)s deste(a)s que motivam. Este sítio está sempre à sua disposição. Para o(a) alimentar com o que tanto gosta.
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