10.11.10

A aventura da educação sexual nas escolas (revisitação de um tema)


http://anjinhoecompanhia.blogs.sapo.pt/arquivo/lindo_areia-thumb.jpg
Não vale a pena repetir que a opção política (ou primeiro pedagógica e só depois política?) de ensinar educação sexual a alunos que irrompem na adolescência é uma polémica interminável. Pelo menos até aos detractores se habituarem à ideia – ou até mudar o governo e, por influência da santa igreja, estas aulas serem encerradas no armário das aberrações.
O que me traz outra vez ao assunto é este texto que as meninas e os meninos têm que ler no contexto da disciplina de educação sexual. É um texto cheio de pedagogia. Diria, ilustrativo. E muito importante. Fala-se de sexo na praia que, como sabemos, é um assunto que interessa aos adolescentes porque nos habituámos a ouvir falar dos efémeros “amores de Verão”. Os tais que ficam “enterrados na areia”. Nem de propósito, o pedagogo de serviço adverte para os perigos das relações sexuais quando há areia metida entre os corpos entregues à sofreguidão lasciva. As meninas e meninos são chamados à atenção para os imponderáveis de ser a areia a enterrar-se juntamente com o órgão masculino reprodutor.
Estou a adivinhar os detractores da educação sexual a pegarem neste texto, usando-o como prova da duvidosa pedagogia adoptada para tratar do assunto. Tenham cuidado: desse modo estão a resvalar para o conservadorismo de sacristia. Também não agrada a ideia de saber que daqui a uns anos a minha filha poderá receber na escola lições básicas de sexualidade. Prefiro que o assunto seja tratado em casa, pois não confio nos dons dos pedagogos que se convenceram que até sexualidade podem ensinar. Um dia destes, com jeitinho, os pedagogos ainda fazem uma perninha no mercado agora ocupado pelos terapeutas sexuais.
Outra vez: é lamentável que as criancinhas tenham aulas de educação sexual. A partir do momento em que isto é irreversível (dentro da contingência do que é irreversível), não adianta dramatizar. Pelo contrário, o assunto traz consigo um lado lúdico. Ao reler aquele pedagógico naco de prosa sobre os cuidados a ter com as relações sexuais que acontecem na praia, uma pessoa não consegue reprimir um sorriso. Aquilo é um compêndio que os humoristas deviam ler de trás para a frente. Humor em estado puro.
Para começar: ou estou desfasado dos acontecimentos, ou suponho que o sexo na praia, sobretudo se for diurno, é coisa rara (se for nocturno, é uma aventura às cegas). É que as praias são frequentadas por muita gente. Cometer a ousadia de fundir dois corpos no areal à frente de olhares escandalizados não é acto que se recomende – e talvez isso é que devia ser ensinado às meninas e aos meninos. Na melhor das hipóteses, os adolescentes que se descontrolarem na praia acabam o dia na esquadra. Na pior das hipóteses, vão parar ao hospital. É não é pelas lacerações resultantes da inoportuna areia (fina ou grossa) que se fez convidada para o acto. Será pela tentativa de linchamento de um bando de pais e mães escandalizados.
Temos que ler o texto com arejamento. A certa altura, o pedagogo adverte que a libidinosa fusão dos corpos dentro de água comporta riscos. Ou porque o salitre da água marinha pode corromper o preservativo; ou porque a gravidade dentro de água é diferente da que estamos habituados, o que pode comprometer “posições tradicionais”. Ora, digam lá se esta prosa não pode ser aproveitada pelo professor de físico-química nas suas aulas?
É uma injustiça que o nome do autor de tão soberba prosa não venha identificado. Sempre o podíamos candidatar a um prémio qualquer – na pedagogia, ou no romance. Ou torná-lo num dos humoristas de referência.
(Funchal)

Sem comentários: