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Os caprichos outonais, aposto, puseram em muita gente um ódio antecipado ao Inverno que ontem entrou no calendário. Já não recordo Outono tão rigoroso. De tanta chuva. De vir agasalhado pelo frio e pela neve que nos últimos anos andaram arredios até da invernia. Não estranha que o nascente Inverno seja amaldiçoado antes do tempo por todos aqueles (e são muitos) que passam pelas estações sombrias (Outono e Inverno) com um esgar de sacrifício.
As pessoas discorrem sobre as estações e o Inverno ganha a palma de patinho feio. Ou porque são friorentas e se congelam com o frio que os dias ensolarados, na sua covardia, espalham. Ou porque detestam a chuva e o vento que despenteiam a boa disposição dos que apenas a arreganham se as nuvens não obscurecerem a divindade solar. Nos mais velhos, a invernia traz achaques. Pode até ser sinónimo do último Inverno, se as doenças que com ele vêm se tornarem tão crónicas que não já não têm cura.
Talvez seja dos quadros mentais, talvez seja por estas terras serem tisnadas por Verões tórridos, a marca digital do epíteto mediterrânico que se nos atrela: o Inverno está próximo de um estado de ódio. É a estação vítima das incompreensões. Dizem-me que há uma aridez mórbida no Inverno. As árvores despidas dos despojos das folhas entretanto caducas. O restolho das folhas que enxameia as ruas corrido pela ventania implacável, sinal de desarrumação que mão alguma consegue conter. Os dias a fio sem sermos testemunhas de um esquálido raio de sol. E os dias pequenos, a noite tão longa que exaspera. As ondas do mar recorrentemente furiosas, como se o mar atravessasse demorados dias na remoção da ira para as praias colonizadas pela água excessiva. A neve que por vezes desce aos níveis próximos do zero marítimo – a mesma abundante neve que se põe em sucessivas camadas nas terras altas. E a chuva que, na sua obstinação quase diária, macera a existência.
Estamos mal habituados. Comparem o Inverno que é nosso com o rigor da invernia em latitudes mais nortenhas. A temperada digressão entre fins de Dezembro e fins de Março é um esboço de Inverno. Os que se queixam dos rigores invernais são uns lingrinhas. Haviam de experimentar os vinte graus negativos do interior do Canadá. Haviam de experimentar os ventos glaciais que transformam sete graus negativos num frio que corta as extremidades do corpo que ousem espreitar além da roupa que as protege. Temos é um Inverno faz de conta.
E, todavia, os esgares de desaprovação que andam na rua em dias de desagradável ventania, ou em dias de frio que ameaça trazer o termómetro para os graus negativos, é a imagem da gente franzina que se apoquenta com uns ares de invernia mais severa. As pessoas indispõem-se quando a invernia entra no calendário e se insinua nos corpos. Nem chegam a perceber o lado virtuoso do Inverno. A luz límpida dos gélidos dias de sol – como se o frio erroneamente apodado de glacial decantasse todas as impurezas que caldeiam a luz do sol. Ou a coreografia desalmada dos elementos em dias de tempestade, como as nuvens se revolvem nas entranhas e despejam chuva a rodos e semeiam ventos tempestuosos que tudo descompõem. Como os rios superam as margens, ou os dias repetidos de frio abaixo de zero condensam os ribeiros em gelo. Ou a neve que se assenhoreia das montanhas, resplandecendo a sua alvura quando o sol desponta sobre os contrafortes das serranias.
Como é excessivo (e por isso adorável) o Inverno!
2 comentários:
O mais importante é o tempo que vai nas nossas cabeças.
PVG
É isso mesmo.
Mas aqui falava do tempo meteorológico propriamente dito. E do encanto do Inverno, essa besta que quase ninguém gosta.
PVM
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