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Na iteração dos equívocos, passeias entre as fumarolas da perplexidade. Diga-se: da perplexidade com que és observado pelos que te querem bem. Não entendem. Não entendem como as tuas pernas teimam em passos que soam a repetição, como se estivesses tomado de uma toleima irremediável. Do lado de lá de ti, olhas como os outros olham para ti para tentares compreender se és um rosário de erros. Ensaias um salto para fora de ti, numa coreografia doída. Haverás um dia de conseguir. Chegarás a esse lugar improvável de onde te observas de fora de ti mesmo, como se empunhasses um espelho que reproduz a tua imagem para fora de ti. Onde estás sentado, em pose ansiosa, a aguardar que na tela passe o filme da tua existência.
Até lá, persistes num romagem cansativa. Arremetes contra as possantes ondas empurradas pela maré onde todos passam. E tu, teimoso, nas braçadas esforçadas que irrompem pela água, sempre para o lado contrário. Confrontam-te. Demonstram como estás fora de ti, em ausente racionalidade – ah, como se a racionalidade fosse critério imperativo, ubíquo. Interiorizas. Espreitas por entre a poeira sedimentada no quarto das memórias. Desta vez, ensaias um adeus perene às atravancadas recordações. As más, que são as mais convenientes de turvar, mas as boas também para não haver parcialidade. Interiorizas outra vez: enxugado o caudal vigoroso das memórias, como se conseguisses parar o rio caudaloso, libertas-te do espartilho das lições aprendidas com os equívocos de outrora.
Tudo é novo. Todas as experiências, como se nunca houvessem sido sentidas. Um dia que se renova é de uma frescura inusitada. E se te interrogam, com a perplexidade de quem se magoa com os teus passos trocados, “não aprendes nada com o passado?”, respondes que o passado é uma inutilidade. E insistes: esse passado, qualquer que seja – o das recordações que interessam resguardar bem junto do peito, ou o das recordações que a memória selectiva trata de ofuscar – não tem serventia para o tempo de que somos curadores. O tempo dos dias presentes.
Eis que chega um portanto em jeito de interrogação: afinal, o que temos a aprender com os despistes pretéritos? E outro afinal que importa: repete-se, o tempo que está deitado na poeira da memória? E então – então, por que nos perdemos em divagações inúteis, tão inúteis como a extrapolação que resgata as bissectrizes transactas e ilude o tempo presente com ilações que se julgam intemporais?
E então? Nada disso interessa. Podem os pés voltar aos mesmo lugares, tolos os pés, sem que o regresso venha enfeitado com as mesmas cambiantes de outrora. O tempo mudou, o corpo envelheceu, as pessoas que estão nesses lugares já não são as mesmas – e se são as mesmas, também mudaram. Como podemos repetir as conclusões quando tudo mudou entretanto? Há um poderoso apelo que vem das entranhas. Para consagrares o tempo vivificante, ignorares as bissectrizes tão científicas que os analistas dos outros tiram, como se acreditassem que a história é um lugar onde tudo se repete. Só que tudo é irrepetível. Por maiores que sejam as semelhanças, por mais parecidos que se montem os palcos onde, apenas na aparência, se repetem os protagonistas.
Desenganem-se os atarantados, boquiabertos apóstolos que redizem as advertências. Tudo é irrepetível.
4 comentários:
O que fazemos hoje não afecta o passado.
O que fazemos hoje afecta o futuro.
Ponte Vasco da Gama
O futuro interessa tanto como o passado.
PVM
De acordo.
O problema é que um só podemos recordar. Quanto ao o outro podemos usar a nossa experiência de vida para, pelo menos, tentar que quando for presente seja sentido como "bom".
E tudo se resume nisto:
Estamos bem? Em paz connosco?
Então siga...! Nunca sabemos quando esse futuro acaba.
PVG
Dizes que o passado é uma inutilidade (no texto) e agora que o futuro interessa tanto como o passado.
Concluo que o futuro não valerá nada para ti.
Se de facto acreditas nisto, o teu texto faz sentido.
Já agora, o teu presente foi o futuro há 2 meses atrás.
PVG
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