In http://www.papeldeparedehd.com/wallpaper/thumb/ceu-azul-e-um-lago-perdido-nas-montanhas.jpg
(Depois do videoclip dos How to
Destroy Angels, “How Long”)
As piores profecias rimam com
distopias. Confirmam o pessimismo antropológico sem remissão. Os maus
predicados da espécie refinam-se no tempo ainda ausente. São cortinas de fumo
que arrancam a bonomia de dentro das pessoas, esventradas pela impiedade,
corroídas por um sentir maquinal que reduz a nada o que ainda haja de benigno.
Talvez por causa de um cataclismo
qualquer, tendo as cidades por dizimadas, a sobrevivência foi atirada para montanhas
inóspitas. As pessoas outra vez caçadoras, ninguém podendo confiar em ninguém.
Os sobreviventes, descrentes nos instintos do semelhante, prostrados numa
errância solitária. Sobram umas exceções – um filho jovem a cuidar da mãe
enferma, a mãe que precisa de beber água fresca para aplacar as dores da doença
porventura terminal. À míngua de água na caverna escavada nos contrafortes da
montanha, o jovem mete-se ao caminho, explora o terreno em redor. Do alto de um
promontório alcança, à distancia de umas léguas, um pequeno lago. Falta vasilha
para armazenar a água. Empreende a descida, não convencido da contrariedade.
Improvisará maneira de reter um pedaço de água.
Ao chegar à margem do lago depara com
um homem velho, longos os cabelos e as barbas, hirsutos e imundos. O homem
verte a água que consegue para um cantil. Tomado por uma demência instantânea,
o jovem ataca o velho pelas costas, deita-lhe as mãos ao pescoço, estrangulando-o.
Poucas as forças, o velho percebe o ocaso que se aproxima. O instinto manda-o ensaiar
um esgar de misericórdia quando os seus olhos conseguem entrar no firmamento
dos olhos do jovem. A demanda é inútil. O rapaz está resoluto. O seu olhar
petrificado finge a demanda de misericórdia. A demência fugaz embaciou o entendimento.
Só havia uma imagem fixa a passar em modo repetitivo: a mãe em sofrimento,
lívida e desidratada, exangue de forças, talvez irremediavelmente condenada.
Mal tirou a vida ao velho, só queria
tornar-se dono do cantil. Já na caverna, puxou a cabeça da mãe para a frente
para que bebesse uns goles de água. A mãe esboçou um sorriso – agradecia. O
rapaz retribuiu, um sorriso ainda mais reprimido. Não sabia se a misericórdia
que negara ao velho fora transferida para a mãe, como se de uma medicinal
transfusão de sangue se tratasse.
Deitou-se cercado de dúvidas. E se a
água e os cuidados que dedicava à mãe em terminal estado fossem a antítese da
misericórdia?
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