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O rapaz, entediado com o pensamento
partido em dois hemisférios divididos, deitou-se afogueado e afogueada foi a
sua alvorada. Pelo meio, um sono desassossegado. Com pesadelos à mistura com a
insónia que teimou em adiar o sono. A atestar pelo calibre dos pesadelos,
julgou o rapaz, antes a insónia tivesse demorado a noite toda.
Era daquelas alturas que pediam
decisão. Havia um equinócio por diante. E o pensamento a esvair-se entre os
dois hemisférios divididos. Temia perder a maré bonançosa, o que soubera sentir
em toda a sua experiência (tardiamente) pueril. Do lado de lá acenava uma
incógnita. Apetecia largar as amarras que o prendiam à inércia do tempo. A
certa altura, entre dois dedos de conversa com a amiga e duas cervejas, deu conta
que queria saborear a alforria. Intuía que era bastião da condição adulta, que já
era extemporânea à idade que levava. Perguntou à amiga:
- Não
achas que devo mudar, deixar tudo para trás, ir para longe, mudar até os estudos?
Mudar de vida, de cima a baixo?
Ela, mais assisada, meteu um travão
nas intenções do rapaz assoberbado pela inquietação interior:
- Não
temes o desconhecido? Não tens medo de partir sem saber o que vais encontrar?
Sabes, um quarto escuro pede uma candeia.
O pensamento continuou dividido em
dois hemisférios, dois hemisférios cortados em metades exatamente iguais. Por
muito tempo – tempo a mais. A decisão continuava em adiamento. Os pesadelos que
contaminavam o sono encurtado doíam com o passar do tempo em que a indecisão
medrava. Às muitas interrogações achava apenas interrogações mais. A densidade
da hesitação cavava uma cova funda, onde mergulhara e de onde parecia
impossível retirar-se. Falou mais vezes com a amiga que tinha como sensata,
como mais ninguém o era. Ela, todavia, não era grande consolo. A sensatez tinha
sido invadida pela febril indecisão do rapaz. Tomara como suas as dores dele.
Ela também tinha o pensamento aprisionado em dois hemisférios herméticos.
Um dia, não conseguindo fugir às
demandas do rapaz, confessou que estava atormentada pelo mesmo embaraço da
escolha. Da escolha que não aportava a cais algum. Angustiada com tal
desconhecido estado, concedeu:
- Pois.
A escolha é um baraço.
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