15.2.13

Safe landing


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(Fragmentos de um pesadelo)
Turbulência. A atmosfera, essa agiota da tranquilidade. Os corpos amassados de um lado para o outro, cobaias da gravidade. Havia olhos marejados pelas lágrimas, mas os corajosos que os envergavam faziam gala de parecer destemidos, não acusavam o pavor que causticava as veias. A maior parte gritava a cada solavanco que parecia afundar o avião, temiam que o céu o virasse do avesso. Alguns vomitavam à medida que na tela mental desfilava o apocalipse em anunciação.
O piloto acenava com promessas de “controlo da situação” enquanto obrigava o uso de cintos de segurança e de máscaras de oxigénio (que estavam ao deus-dará com o motim tempestuoso que atirava o avião de um lado para o outro). Era como se a ira dos elementos tivesse confluído naquele lugar e àquela hora, aquela maldita hora em que o avião fora escolhido pela providência das calamidades. Um raio de trovoada esborrachou-se numa das asas do avião – e logo muitos crentes (e outros convertidos à força, não fossem excluídos do prometido degredo celestial em que até há instantes não acreditavam) começaram a entoar preces. Temiam que fosse um sinal divino, como diziam que havia sido o raio enviado para a morada do papa no dia em que anunciou a renúncia ao papado.
Foi tanto tempo nesta embrulhada que as pessoas não conseguiam ter uma noção exata da demora. A tempestade passara. Os executivos que viajavam na classe executiva soltavam o nó da gravata para dar espaço à carótida inchada. Eram os nervos em descompressão. Um gordo a meio do avião estava lavado em suor. Algumas senhoras apresentavam-se na sua lividez. Uma freira sem hábito reuniu umas crentes e desenovelaram umas rezas de agradecimento por o final calamitoso ter sido adiado.
Um rapaz com boné virado do avesso dormia o sono dos justos. O homem sentado ao seu lado jurou que o rapaz não desligou do sono sequer por um instante. Deu-lhe um encontrão. Nada. Chamou uma hospedeira, que veio na companhia de mais três. A páginas tantas, estaria o rapaz morto (podia ser um correio de droga, que era habitual na procedência do avião). Uma das hospedeiras deu um sopapo firme no rapaz, depois de todas as anteriores infrutíferas tentativas. E o rapaz, que parecia tomado pela turbulência que não sentira, perguntou sobressaltado (e em inglês) se já tinham feito aterragem segura.

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