11.11.13

“Estou a ficar mais novo”

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Descobri o elixir da juventude”, apregoava às quatro partidas do mundo, aos ouvidos que o queriam ouvir e aos ouvidos indiferentes que, contudo, depois de o ouvirem não resistiam ao acosso da curiosidade. Nem muitos lhe davam crédito. Os que o conheciam – eram muitos – sabiam da prosápia, conheciam o palrador nato, o contador de histórias que enfeitiçava a audiência ao ponto desta já não saber onde estava a linha de fronteira entre a realidade e a fantasia.
Apesar de serem poucas as credenciais de reputação, os ouvidos que esbarravam na frase quimérica desembainhavam os alfinetes da atenção. “Como podia ter encontrado o elixir da juventude?” – era a interrogação que vinha à flor da pele. Se fosse possível adiar o envelhecimento, por que não tomar conhecimento da matéria com mágicas propriedades? Mas antes de se deitarem com ele na audição da convincente historieta, os que desembolsavam uma maquia de confiança fitavam-no de cima a baixo, indagando se estava a caminho de estar mais novo. Não notavam rugas, o olhar era cristalino e cintilante, os dentes brancos ostentavam outra marca de rejuvenescimento, trazia consigo um aspeto físico impecável e fazia ponto de honra em se apresentar apessoado. O puzzle fazia um todo coerente. O apetite pelo elixir da juventude aumentava com o liminar exame externo às suas faculdades. Era quando começavam as interrogações. Queriam saber, os que corrompiam a circular oficial que atestava a sua fraca fama, como aportara ao elixir da juventude. Sem preâmbulos, disparava o segredo:
- Viajei. Viajei muito. Conheci muitos lugares e pessoas muito diferentes. Comunguei culturas. Fui diferente da minha idiossincrasia. Aliás, perdi o rasto à minha idiossincrasia. Não perdi nada, no fim de contas. Ganhei tudo. Amadureci antes do tempo. Com esta madurez, e toda a bagagem cultural que é meu lastro, fiz-me mais novo. Todas as paisagens, em toda a sua acentuada diferença, são a revivescência de mim.
Os que entoavam preces à sedentária forma de viver viraram costas. Os que não se importam com a velhice, mas compareceram na fugaz confiança de que fosse milagroso o elixir da juventude ruidosamente propagandeado, desmobilizaram. Era muito alto o preço pelo retrocesso do interior relógio que compassa o tempo que vem no seu particular relógio. Mais valia deixar o tempo correr o seu tempo natural. Não sobraram muitos convencidos. Um punhado, não mais. Só que a esses havia míngua de recursos para se emprestarem às viagens frequentes, às viagens demoradas. O envelhecimento era irremediável. Ele, todavia, assomava contra a maré. Uns acordavam com a idade quebrada nas rugas do rosto e nos cabelos grisalhos onde outrora não eram pertença. Ele passava pelos dias, diletante, a desanimar os restantes, anunciando “estou a ficar mais novo”.

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