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Na Síria, a bestialidade da guerra constrói
cidades fantasmas entre a destruição das armas. Há gente assisada que foge da
morte que os feiticeiros da guerra anseiam espalhar. Deixam tudo para trás.
Haveres e memórias, um pedaço de si, desenraizados à força pela força bruta das
armas. Sobejam os animais de estimação, que ficaram a importunar os fantasmas
que quiseram tomar de assalto as cidades que os furibundos guerreiros queriam
que fossem fantasmas.
Os gatos sem dono não têm mantimentos.
Estavam condenados à morte pela jugular do abandono da cidade. Mas há um homem
que vai todos os dias à cidade perdida para alimentar os gatos errantes. Gasta
três euros por dia nos mantimentos. Enquanto, nos arredores, os combatentes
fazem troar a artilharia pesada e no ar pesa o cheiro pútrido dos corpos
despedaçados pelos obuses e metralhadoras. Só há sentido de humanidade se
ajudar quem não se oferece no altar da guerra, agora que os inocentes se
puseram a léguas e recebem ajuda de outros voluntários.
O condutor de ambulância não perde o
norte à rotina. Com os gatos à sua ilharga, já não famintos mas amigos dele,
mete luvas nas mãos e oferece pequenos pedaços de carne à boca dos bichos.
Imagina-se que os gatos desatam numa correria mal vêm a ambulância a chegar. E
que os gatos ronronam ruidosamente mal vêm o condutor da ambulância com o saco
carregado de carne, sinal da refeição diária. Em grupo, cercam o condutor da
ambulância e esfregam-se nas suas pernas, convocando a atenção que o homem
procura desdobrar pelos gatos.
Esta é a estória de uma sobrevivência
improvável. O porvir será o curador dos gatos que a guerra condenou à
indigência e ao desafeto por separação dos donos. Assim sobreviva o condutor da
ambulância, que faz generosidade com os gatos por os homens ensandecidos com a
poeira da guerra terem retirado do seu pessoal dicionário a palavra bondade.
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