5.1.16

As aldeias moribundas

Tricky & Alison Goldfrapp, “Pumpkin”, in https://www.youtube.com/watch?v=K6tTqE-71H0
Onde dantes prosperavam, dentro da pobreza permitida, as gentes. As gentes nascidas e educadas nos pequenos lugarejos nos interstícios das montanhas. Nas aldeias que tinham casas abundantes.
Agora, as mesmas casas abundantes são sítios abandonados, em ruínas, a imagem da decadência de uma certa ruralidade. A imagem da decadência de um país rural cultivado por um regime político que patrocinava a servidão a que as gentes se deviam curvar, com o beneplácito da hierarquia religiosa (que a modéstia de costumes e um viver monástico ajudavam a conservar a obediência aos padres que apascentavam as almas).
Agora, os mais novos, os que tiveram berço nas aldeias dos seus antepassados, migram, mal podem, para as grandes urbes, para o estrangeiro, até. Os laços adelgaçam-se à medida que estas gentes se enraízam nas grandes cidades. À medida que os descendentes destes migrantes que alimentaram o êxodo rural se convencem que o conforto está nas cidades despersonalizadas. Sobram os casarios de pedra sem serventia para a gente que os não quer visitar. Começa a decadência desse casario. E por mais que as pedras graníticas que esteiam as paredes das casas resistam à erosão do abandono, as casas entram num processo de lenta ruína. Onde dantes havia crianças descalças a brincar com os animais e a ajudar os pais nas lides do campo, há hoje lugarejos mortiços, desamparados de gente ou, na melhor das hipóteses, povoados por gente envelhecida. Por pessoas cansadas e tristes, mercê dos sacrifícios da vida do campo e por causa da melancolia que delas se apodera ao serem espetadoras passivas do emagrecimento das aldeias.
É um processo irremediável de esgotamento das aldeias. No fim da linha, quando se sucederem os funerais dos derradeiros habitantes das aldeias, ficará o amontoado de casas que se despedaçam em ruínas à míngua de gente para as cuidar. E onde dantes havia gente expedita, famílias compostas por três e às vezes quatro gerações, haverá depois o silêncio dos lacraus que, furtivos, espreitam entre as pedras gastas do casario.

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