Ty Segall, “The Singer”, in
https://www.youtube.com/watch?v=Quou6o05g5A
É melhor o petiz ouvir o que os mais velhos têm para
ensinar. Especial, a atenção, quando das sábias bocas soam advertências; pois
os mais velhos só querem o seu bem, de tal arte que se incomodam em oferecer sábios
conselhos. O petiz deve-lhes gratidão. Cresce sob a sua imensa batuta e sob uma
asa protetora. Começa a perceber que, ao chegar a grande, convém ser um émulo
dos mais velhos. Se, pelo caminho, o petiz passar por uma formatação das
ideias, que se dane: é o custo necessário da aprendizagem da civilização, mercê
da bagagem de conhecimentos dos mais velhos que estão aptos a adestrar o petiz ao
suprassumo tirocínio da vida: a socialização.
O processo não é gratuito, nem isento de reveses. Não é
gratuito, porque a irreverência do petiz tem de ser domada. Se assim não for,
ele não está pronto para a socialização. Transforma-se num pária, ou – em sendo
pior o desalinhamento com os usos – em sociopata. Também não é isento de
reveses, pois os desvios ao processo merecem castigo. A punição é o antónimo da
recompensa. E se o petiz se lambuza só de saber que há opípara sobremesa a
finalizar o jantar, atira-se-lhe com a promessa de dose farta e de repetição,
caso se não encha com tamanha dose, se fizer o que deve ser feito segundo a
cartografia dos comportamentos dedilhada pelos mais velhos. O fio de prumo é frágil,
pois a recompensa depressa tropeça numa punição – e das sádicas – se ao petiz
for recusada a sobremesa por dissidência do roteiro congeminado. Por isso o
petiz ouve a promessa de punição (“porta-te bem, ou não comes a sobremesa ao
jantar”) para o caso de lhe dar para a rebeldia inconsequente.
No fim de contas, a punição prometida é a recompensa no
seu reverso. O petiz é informado, com voz condescendente e pedagógica, que as
coisas têm de ser feitas “como deve ser”. Se assim for, há lauta sobremesa a
coroar o jantar. E como ele gosta de sobremesa! Como gosta de sobremesa, é fácil
corrompê-lo. Levá-lo a ser como os mais velhos se fizeram. A ser normal. Sem
perguntas incómodas; sem questionar por que “deve ser” como é. Pois os mais
velhos também foram instruídos assim. A antiguidade reflete as comendas da
vida. O lastro da experiência não pactua com questionamentos pueris.
Assim se fazem as gentes adultas numa posteridade que as
receba como adultas. A culpa, isso é certo, não é da sobremesa depois do
jantar. É da “normalidade”.
Sem comentários:
Enviar um comentário