Faith No More, “Stripsearch”,
in https://www.youtube.com/watch?v=-_U6165DVeM
O lenço baço cobre os olhos. Os olhos
ficam impedidos de ver. Todavia, aceita o repto: “fecha os olhos, tenho uma surpresa para ti.” O irrecusável apetite
por enigmas é a passadeira que se estende para aceitar os olhos vendados. Vá-se
lá saber o que virá desembrulhado depois de os olhos se cindirem no objeto
surpresa, mal sejam desvendados.
Enquanto permanecem dentro da
cortina à prova de luz, pensamentos contraditórios enxameiam a espera. A surpresa
pode fazer jus à etimologia: os olhos reabertos saciam-se no inesperado, mas recompensador,
desfecho. Ou o contrário: há surpresas com mau fim. Nesta miríade de pensamentos
divergentes, começa-se a impacientar. Se há alturas em que a adrenalina toma
conta do sangue, convencido que será uma surpresa que merece ficar emoldurada
nos atos pretéritos, noutras alturas é acometido pela apoplexia, desconfiando
que a surpresa pode ser um ardil e ele a sua vítima.
Refreia a febril indiscrição. À passagem
do tempo, o sobressalto sobrepõe-se à metade que admite um bom fim para o
enigma. A impaciência lateja na jugular. Sente umas pequenas gotas de suor frio
a escorrer pela lateral do rosto e a tomarem conta da curvatura entre os músculos
lombares. As próprias mãos estão suadas. E, contudo, aquele lugar ermo está
frio. Não se justifica o suor quando está um frio ambiente. A secura apodera-se
da boca. A língua procura o contínuo massajar dos lábios terçando contra a pele
ressequida. Já não consegue estar imóvel na marquesa. Está nervoso e sente cada
milímetro da inquietação do corpo. O silêncio é maçador. Magoa por dentro, como
se as entranhas estivessem a ser invadidas por música ruidosa, ou por música
que gravita nos antípodas da sua estética condição, ou por palavras ditas por
pessoas entronizadas no altar das irritações.
Não consegue esperar mais tempo. Ainda
pergunta “está aí alguém?”. Continua
servido um denso manto de silêncio. Não há vozes, não há sequer o menor
rumorejo da presença de corpos. Leva a mão ao lenço baço que tapa os olhos. Hesita.
Por um momento, interroga-se que cominação será imposta se aquela for uma regra
que se prepara para rasgar, mal a mão suba o lenço baço. Não quer saber do jogo.
Não se importa que a impaciência seja punida.
Os olhos estão sem a venda opaca.
Espreitam por uma pequena claraboia que os dedos ajudaram a congeminar. Mesmo assim,
os olhos continuam sitiados no crepúsculo do lugar.
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