Dead Can Dance, “Anastasis”,
in https://www.youtube.com/watch?v=aiDNf8trWn8
Que não te seja tolhido o passo
pelos embaraços em que ele tropeçar. A capitulação não é própria dos pacientes.
Que não haja equívocos: não se trata de teimosia; nem tão pouco de envergar os
galões de herói (que da heroicidade se considera coisa pueril e falsária).
Um exemplo: há empreitada que se
assemelha intrépida quando se enceta. No primeiro contacto, não é a sua dimensão
que intimida. A vontade em ebulição arroteia os passos necessários para arrematar
a empreitada. Algum tempo depois, o peso das contrariedades arqueia-se sobre o
dorso que começa a dar os primeiros sinais de desmotivação. As primeiras
hesitações afloram na pele; soerguem-se as primeiras interrogações que, em repetitiva
espiral, abrem uma funda cova onde se enterra a máscara (sabe-se agora) da tenacidade.
O esquecimento cuida do resto: com o beneplácito do tempo poltrão, a empreitada
encomenda-se ao arquivamento no espaço onde, convenientemente, a desmemória encontra
seu húmus. E como o esquecimento tem muitas paternidades, ninguém evoca o acerto
de contas a que prometeu a empreitada e dela se olvidou.
Eis um manual para contrariar os
embaraços que queiram locupletar um desígnio apalavrado. Primeiro, não deixar
de insistir. Não caducar a vontade aos primeiros contratempos. Os contratempos
exigem cuidada depuração: por que ocorreram? Que receita se pode prescrever
para os ultrapassar? Sempre deste modo para todos os contratempos, um atrás do
outro, mesmo que, a certa altura, adeje a impressão de que a meta está mais
longe mercê das forças usadas (e a caminho de estarem exangues) para derrotar
os contratempos que foram sendo alinhavados.
Segundo: parar para pensar. Metodicamente.
É melhor predicamento (do que desistir). É preciso parar e amadurecer o
pensamento, caso se inventariem tantas contrariedades que a empreitada se
afigura uma impossibilidade prestes a ser assim formalizada. Às vezes, é
preciso repensar tudo. Repensar a própria empreitada, que pode deixar de fazer
sentido se o palco em que se terçam as forças contrárias (as favoráveis ao desejo
e as que se jogam contra ele) revela uma nova correlação de forças – ou quando
a frieza do raciocínio permita descobrir a inutilidade da empreitada após os
recentes acontecimentos, pelo menos a inutilidade na sua configuração original.
Às vezes, é preciso repensar o método para chegar ao resultado esperado. Pode ser
preciso mudar a estratégia a eito, ou apenas algumas das suas facetas. A desorientação
consecutiva aos primeiros sinais de desencorajamento não é boa conselheira da
revisão de tudo o que for preciso rever.
Terceiro: não se pode prescindir
da paciência. Nem pode o raciocínio embotar na presença dos contratempos
sucessivos. As provações que desfilam em palco são um desafio à destreza do
pensamento. Na guerra surda e sem armas que se inicia, vencerá o promitente da
empreitada se souber manter o raciocínio frio, se souber ser paciente. Ou nem
vale a pena o consumo de forças para esboçar, em estirador condenado ao
malogro, as empreitadas depois fracassadas (porque esquecidas).
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