The Legendary Tigerman, “Black
Hole” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=Fvi6iwKZhwg
Mandam os alquimistas, ou são
mandados pelos gurus da modernidade que, a páginas tantas, descobrem os malefícios
de substâncias e ordenam aos alquimistas para usarem da ciência com o propósito
de serem extirpadas as malévolas substâncias da ordem dos ingredientes?
Trata-se de adulteração da ordem
da natureza. Não que seja um defensor da imutabilidade da natureza – não é isso
que está em causa. A busca de purificação de matéria composta por ingredientes
impuros é uma estéril maneira de subtrair dessa matéria a sua inata substância.
São os descafeinados, os desnatados, os dessalinizados, os doces sem açúcar, as
cervejas sem álcool – falta o tabaco sem nicotina, as drogas sem efeitos
psicotrópicos, num movimento que causa a anulação do efeito dantes pretendido,
transfigurando-o numa ordem refeita.
A fobia por uma saúde impecável, sem
as pessoas se exporem a ingredientes de risco que podem esfrangalhar a sua saúde,
é interessante para os alquimistas que são ratos de laboratório e precisam de inventar
o que dantes não estava inventado. Não ponho em causa estes alquimistas: muitos
avanços na saúde humana devem-se ao seu espírito inventivo. Já me transtorna
saber que há matérias que ficam – por assim dizer – desmaterializadas mercê da
purificação engendrada pelos alquimistas. Continua a faltar saber qual é a
ordem dos fatores: se foram as descobertas da ciência que abriram a janela de
oportunidade aos tutores do novo homem novo, ou se as modernas alquimias foram
encomendadas por estes engenheiros de uma nova sociedade imaculadamente estéril
como engodo para trazer os seus membros sob uma apertada trela.
Já houve quem a isto chamasse “fascismo
higiénico”. Não se cuida aqui de defender o estabelecido, como se estivesse a
fazer um jeito aos conservadores que odeiam tudo o que seja mudança. Apontar
todos estes “des” que adulteram ingredientes, tornando-os puramente sadios, deixa
o pavio aceso para outras oportunidades. É só puxar pela imaginação. Exercício físico
sem dor. Sexo sem a combustão dos corpos (eu sei, também o há – mas não é dessa
modalidade a que me refiro). Flores à prova de alergias. E, já agora, flores
dantes prolíficas em odores, mas doravante neutras. Gelados sem frio (a
preceito das pessoas com sensibilidade dentária). Todos os livros sem ser
preciso lê-los, pois trazem ficheiro áudio com a narração. Condimentos picantes
que não deixam a boca a arder. Praias de nudismo sem ser preciso ficar nu. E por
aí fora.
Até sermos todos um imenso destudo, com a proibição de destoarmos. Será
hediondo um sítio assim, tão monotonamente igual, tão assético.
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