29.11.18

Clorofórmio, “a bem da nação” (short stories #74)


LCD Soundsystem, “You Wanted a Hit” (Live on Austin City Limits), in https://www.youtube.com/watch?v=_1c1zhV3vHk
          Que smoking impecavelmente engomado. Que vestido de lantejoulas milimetricamente cintado no corpo elegante, feito à medida do vestido (e não contrário). Que néones deslumbrantes, o pináculo da sociedade efervescente e dos não comezinhos fazedores de modas e de opiniões. Que universo resplandecente, porventura os seus atores imunes aos achaques da humanidade, todo ele no pesponto da irradiação dos seres cuja perfeição foi feita à prova de bala. Que palco acetinado por onde desfila apenas o escol. Que festividades onde todos olham para todos e nenhum olha por si. Que deslumbramento feérico onde se colhe o húmus da frivolidade. Que pertences parasitas, que se encostam perenemente ao estatuto para obterem prebendas e sinecuras apenas pelos pergaminhos que ostentam em público. Que esgoto serventuário de figurões impantes, beócios indistintos, apedeutas, acéfalos seguidores uns dos outros, poupando no vocabulário usado ora para não escorregarem para a herética crítica, ora por manifesta incapacidade. Que passadeira simultaneamente reluzente e puída, o reluzente ocultando o puído das bainhas de quem se ostenta no centrípeto lugar que cativa as atenções. Que figuras fulgurantes se soerguem na espuma oca que habita nas páginas das revistas da especialidade, e depois se evaporam quando a maré deixa de os trazer no protetor regaço. Que estultos espécimes, que se fartam de agredir a gramática e a sintaxe. Que indisfarçável vaidade, muralha que esconde fragilidades inconfessáveis por intermediação de um manto de inatacável condição. Que presunção homérica. Que poltrões situados nas margens da infecunda servidão. Que asfixiantes personagens que poluem com seus rostos amplamente sorridentes, dos tais que brancos dentes têm para mostrar, no tribunício altar de onde são sacerdotes e primeiros cultores de um séquito que inventam. Que fantasioso cosmos em que medram peritos assoberbados com a fragilidade do invólucro que os reveste, sem saberem do paradeiro da malha mais funda que se confunde com sua leviandade. Que frondosa casa habitada por escolhidos pela vacuidade de seus estamentos. Que impecável lugar, este, habitado por cidadãos que perdem minutos da sua (desinteressante) vidinha a dar conta dos desenvolvimentos da (desinteressante, mas flamífera) vidinha dos exultantes apóstolos do desanonimato. Clorofórmio, e abundante, em cima deste mapa!

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