7.7.25

Para que precisamos da redenção?

The Limiñanas, “Faded”, in https://www.youtube.com/watch?v=91nScqn8lUY

Precisamos de esconjurar o futuro. Como se a mão que se dá a esse tempo venha limpa do tempo pretérito para travar os instintos que possam contaminar o tempo por haver. Os arrependimentos são cíclicos e apenas mostram a formidável capacidade que temos para errar. 

Não há nenhum mal nisso (no erro). Quando investimos na redenção parece que temos vergonha do futuro, se o futuro insistir nos erros mesmos do passado. Porque o erro é imprevisível. Mesmo que se fique a dever apenas à nossa vontade e não dependa de circunstâncias exteriores, o erro acontece com a mesma naturalidade da respiração ou da trajetória invisível das células que navegam, invisíveis, pelo corpo.

A redenção é uma das piores invenções da humanidade. Força uma confusão entre humildade e humilhação. Parte de humildade: a admissão do erro, que vai rareando num mundo ditado pelo ensimesmar e pela infalibilidade, muitas vezes exteriorizada através do endosso da culpa para o exterior. E termina na humilhação: a exposição pública do arrependido, como súplica para a indulgência dos outros que se sentam num involuntário lugar de juízes. O processo é um desinvestimento interior e a convocatória abusiva dos outros. O desapossamento dos efeitos dos nossos atos corresponde à exposição perante o juízo que nos é exterior. Às vezes, é uma violência que exportamos para a raiz dos outros.

A redenção pode ser uma máscara artificial que finge as dores que causam tanta consumição. É uma forma de apagar o passado, como se fosse determinante para um começar de novo que começa de novo repetidas vezes, num processo interminável e que perde credibilidade à medida que se repete. A redenção coloca-nos sob a égide de uma figura postiça. Insatisfeitos com decisões ou palavras, invocamos a redenção como nossa procuradora. E regressamos ao futuro com a folha em branco, preparados para voltar ao erro sem que o erro seja uma repetição.

O perdão só é preciso quando existe culpa, e culpa reconhecida pelos próprios. O erro é-nos inato. Não precisa de perdão. Dispensa a redenção.

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