31.3.04

Uma ode à virgindade celestial

João César das Neves, em artigo de opinião publicado no Diário de Notícias da passada segunda-feira, escreveu o seguinte:

São hoje esquecidas e atacadas as duas razões mais próprias da glória feminina, o encanto da virgindade e a grandeza da maternidade. O engano é tal que vemos mulheres apreciar como ganhos a perversão da maternidade pelo aborto, da virgindade pela libertinagem, da família pelo divórcio. Cedem à promiscuidade e pornografia, velhas obsessões varonis. (…) Felizmente que, apesar da tirania da opinião, grande parte das mulheres resiste à pressão e preserva a superioridade. A virgindade e a maternidade brilham ainda neste tempo confuso. E, juntas na mesma pessoa, cintilam no mais alto dos céus, acima de toda a criatura.

Eis a beatitude católica no seu máximo esplendor. A afirmação de verdades incontestáveis, ainda que com o toque da realidade apareçam desenquadradas do tempo em que vivemos. Será, quando muito, um “wishful thinking” deste expoente laico do fundamentalismo católico que ainda regurgita. Uma exibição do beato de serviço que, a espaços, escreve nacos de uma cartilha que nós, seguidores ou ovelhas tresmalhadas, devemos obedecer para não perdermos o norte no rumo espiritual que nos deve guiar.

Vou ignorar um dos esteios da “glória feminina”, a maternidade. Prefiro concentrar-me na digressão sobre a virgindade. A mulher deve preservar este valor que lhe é imposto do exterior, mesmo que isso corresponda à castração do seu íntimo, a uma violentação da vontade espontânea que se forma dentro dela . Que interessa se "a virgindade é trocada pela libertinagem” se essa opção apenas disser respeito à mulher que a toma? Será César das Neves (ou outro guardião da moral e dos bons costumes) o juiz supremo para avaliar o comportamento dos outros? Gostaria que alguém exterior a ele viesse tecer considerações éticas acerca dos seus comportamentos pessoais?

A Igreja não aprende a libertar-se das amarras de um totalitarismo que se impõe sobre o íntimo de cada ser humano. Por detrás de uma retórica de libertação da alma encontra-se um código de conduta cheio de sinais de repressão, que força o arrependimento quando o abominável pecado fala mais forte.

César das Neves vê, no fio do horizonte, um sinal esperançoso. A maioria das mulheres está a inverter a deplorável tendência da libertação do corpo e da alma. Em nome de uma virgindade que não se compreende bem que objectivo pretende alcançar, César das Neves anuncia, com uma felicidade contagiante, que há cada vez mais mulheres a regressar ao valor da virgindade. Presumo que são apenas aquelas que ainda não o deixaram de ser.

As mulheres estão de regresso ao valor da virgindade? Só se for lá na paróquia dele! E mesmo que seja, deito-me a adivinhar como terá César das Neves chegado a esta conclusão. Estou a vê-lo, nos encontros de doutrinação do jovem rebanho feminino, a perguntar em tom paternalista mas inquisidor: “noviças, quais de vós são ainda virgens?” Está-se mesmo a ver que, com pudor, muitas – senão todas – dirão ao senhor da barbicha que ainda não experimentaram os deleites do sexo (perdão, o pecado do sexo).

Às vezes faz sentido dizer que os extremos se tocam. Neste caso, serão diferentes lados das barricadas religiosas que se encontram num cruzamento que une estradas vindas de sítios opostos. É com o elogio da virgindade deste fundamentalista católico que agora compreendo porque os fundamentalistas islâmicos oferecem a sua vida em troca das setenta virgens que lhes são prometidas assim que a sua alma é encomendada ao céu quando cometem atentados kamikaze.

1 comentário:

Unknown disse...

fnao entendo como certos homens gostam tanto de sentir o gosto de homens atraves das mulheres que os tiveram
eu prefiro uma que nao tenha se contaminado com outro homem
willy
billygyn@hotmail.com