Um pouco de conversa meteorológica – daquela que metemos quando não temos outro assunto: já chove há quinze dias. É tema recorrente nas mesas dos cafés: o povo denuncia o tempo louco. E está descontente, pois há semanas soltaram notícias de que este ia ser um Verão tórrido. Afinal, chove há quinze dias. Junho tem sido um mês atípico, tristonho, carrancudo, tingido com a cor plúmbea das nuvens tão carregadas. Hoje a Primavera despede-se. Com uma cara outonal.
Quando o tempo prega destas partidas, a comunicação social vai de visita até ao Instituto Nacional de Meteorologia. Palavra aos especialistas. Há dias entrevistaram a meteorologista de serviço, para saber explicação acerca do tempo ensandecido que até ao Algarve trouxe um cocktail assassino para o turismo – nuvens e chuva e temperaturas que são promessas atraiçoadas para o turista inglês que lá chegou com a expectativa de rivalizar com as lagostas suadas. A meteorologista lá concedeu que este é um tempo fora do normal. Temperaturas anormalmente baixas e “índices de precipitação” acima da média. Mas avisou, condescendente com o tempo que se faz sentir: não é nada que já não se tenha visto em Junhos de outros anos.
Retive o ar ao mesmo tempo cândido e empertigado da meteorologista. Parecia querer desculpar o tempo que anda a ser vergastado pelo cidadão comum. Se calhar também tem escutado as conversas de café que chamam nomes feios ao tempo que teima em espalhar as bátegas de água aspergidas por um vento furioso. Desgostosa por estarem a ser tão ásperos com o seu menino querido – o tempo, o tempo seja ele soalheiro e caloroso, ou ventoso e outonal, ou de chuvas impiedosas, ou até o tempo invernal que semeia temperaturas glaciares – a técnica veio em defesa do tempo. Parecia um pai de coração ferido por estarem todos a apontar o dedo ao seu querido filho. Por um momento, parecia que o tempo tinha conquistado uma dimensão humana. A meteorologista fazia as vezes de advogada de defesa do tempo. Advertiu-nos: ó povo de memória curta, os dados estatísticos do Instituto Nacional de Meteorologia mostram que este Junho não está assim tão louco como querer fazer crer. Outros Junhos de outrora foram muito chuvosos.
O povo que quer esturricar ao sol, fazendo ouvidos moucos aos avisos dos dermatologistas que desaconselham exposição ao sol entre as onze da manhã e as seis da tarde, está-se nas tintas para os predicados técnicos da meteorologista. O povo anda de mau humor, em parelha com o tempo sombrio. O mau humor vem em crescendo porque as promessas dos meteorologistas, as promessas do bom tempo resgatado, vêm sendo adiadas. Diziam que o mau tempo se ia ficar pelo último fim-de-semana. Três dias passaram e a chuva continua a molhar as esperanças dos veraneantes adiados. Ao menos não se fala de incêndios. A ausência das praias coincide com o descanso dos bombeiros.
(Um parêntesis, literal: porque se terá convencionado chamar “bom tempo” ao bom tempo e “mau tempo” ao mau tempo? “Bom” e “mau” implicam juízos de valor. Fomos educados a olhar para a chuva como “mau tempo”, quando afinal é ela que mata a seca que seria o gérmen da morte. Há muito de bom no que se convencionou apelidar “mau tempo”. Conversamente, um prolongado estio, ou dias consecutivos de sol durante o Inverno, jamais serão sinais de “bom tempo”: a magreza da chuva traz preocupações, espalha imagens lancinantes do gado a morrer nos pastos, semeia a incerteza no abastecimento de água às populações.)
Regresso à imagem da meteorologista em defesa do “mau tempo” de Junho. Uma defesa exaltada do menino querido. Não sei se ela queria dizer algo nas entrelinhas. Adivinho que a meteorologista deve estar alistada nas fileiras de Al Gore, ou de outros ambientalistas menos oportunistas, dizendo nas entrelinhas que o povo não se pode queixar do tempo louco. Quem o faz louco é o povo sem hábitos ambientais, que comete agressões diárias ao meio ambiente. É o povo que adultera a meteorologia. Que não se queixe de, na volta, o tempo se vingar fazendo tantas caras feias, presenteando um tempo extemporâneo que causa dissabores generalizados. A meteorologista reagia, indignada, contra uma acusação injusta. O seu menino querido, que anda mal-humorado há quinze dias, tem direito aos seus maus humores.
Quando o tempo prega destas partidas, a comunicação social vai de visita até ao Instituto Nacional de Meteorologia. Palavra aos especialistas. Há dias entrevistaram a meteorologista de serviço, para saber explicação acerca do tempo ensandecido que até ao Algarve trouxe um cocktail assassino para o turismo – nuvens e chuva e temperaturas que são promessas atraiçoadas para o turista inglês que lá chegou com a expectativa de rivalizar com as lagostas suadas. A meteorologista lá concedeu que este é um tempo fora do normal. Temperaturas anormalmente baixas e “índices de precipitação” acima da média. Mas avisou, condescendente com o tempo que se faz sentir: não é nada que já não se tenha visto em Junhos de outros anos.
Retive o ar ao mesmo tempo cândido e empertigado da meteorologista. Parecia querer desculpar o tempo que anda a ser vergastado pelo cidadão comum. Se calhar também tem escutado as conversas de café que chamam nomes feios ao tempo que teima em espalhar as bátegas de água aspergidas por um vento furioso. Desgostosa por estarem a ser tão ásperos com o seu menino querido – o tempo, o tempo seja ele soalheiro e caloroso, ou ventoso e outonal, ou de chuvas impiedosas, ou até o tempo invernal que semeia temperaturas glaciares – a técnica veio em defesa do tempo. Parecia um pai de coração ferido por estarem todos a apontar o dedo ao seu querido filho. Por um momento, parecia que o tempo tinha conquistado uma dimensão humana. A meteorologista fazia as vezes de advogada de defesa do tempo. Advertiu-nos: ó povo de memória curta, os dados estatísticos do Instituto Nacional de Meteorologia mostram que este Junho não está assim tão louco como querer fazer crer. Outros Junhos de outrora foram muito chuvosos.
O povo que quer esturricar ao sol, fazendo ouvidos moucos aos avisos dos dermatologistas que desaconselham exposição ao sol entre as onze da manhã e as seis da tarde, está-se nas tintas para os predicados técnicos da meteorologista. O povo anda de mau humor, em parelha com o tempo sombrio. O mau humor vem em crescendo porque as promessas dos meteorologistas, as promessas do bom tempo resgatado, vêm sendo adiadas. Diziam que o mau tempo se ia ficar pelo último fim-de-semana. Três dias passaram e a chuva continua a molhar as esperanças dos veraneantes adiados. Ao menos não se fala de incêndios. A ausência das praias coincide com o descanso dos bombeiros.
(Um parêntesis, literal: porque se terá convencionado chamar “bom tempo” ao bom tempo e “mau tempo” ao mau tempo? “Bom” e “mau” implicam juízos de valor. Fomos educados a olhar para a chuva como “mau tempo”, quando afinal é ela que mata a seca que seria o gérmen da morte. Há muito de bom no que se convencionou apelidar “mau tempo”. Conversamente, um prolongado estio, ou dias consecutivos de sol durante o Inverno, jamais serão sinais de “bom tempo”: a magreza da chuva traz preocupações, espalha imagens lancinantes do gado a morrer nos pastos, semeia a incerteza no abastecimento de água às populações.)
Regresso à imagem da meteorologista em defesa do “mau tempo” de Junho. Uma defesa exaltada do menino querido. Não sei se ela queria dizer algo nas entrelinhas. Adivinho que a meteorologista deve estar alistada nas fileiras de Al Gore, ou de outros ambientalistas menos oportunistas, dizendo nas entrelinhas que o povo não se pode queixar do tempo louco. Quem o faz louco é o povo sem hábitos ambientais, que comete agressões diárias ao meio ambiente. É o povo que adultera a meteorologia. Que não se queixe de, na volta, o tempo se vingar fazendo tantas caras feias, presenteando um tempo extemporâneo que causa dissabores generalizados. A meteorologista reagia, indignada, contra uma acusação injusta. O seu menino querido, que anda mal-humorado há quinze dias, tem direito aos seus maus humores.
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