A palavra vale mais que a assinatura num papel – é regra de conduta, uma espécie de código de honra que, fosse levado a sério, anunciava a desgraça dos juristas. Então seriam dispensáveis, os juristas, por deserção das suas funções. É por isso que faz algum sentido a convicção popular de que um jurista existe porque há leis para quebrar. Quando o problema se põe ao nível das pessoas comuns, os tribunais estão por aí para ajuizar conflitos. Tudo se complica quando o papel de infractor é desempenhado por entidades que se acham impunes, como se vogassem acima das normas que elas mesmas fazem gala de coagir os outros ao respeito.
Falo dos governos. E dos partidos políticos, que antes de chegarem ao ambicionado cadeirão do poder se desdobram em promessas mil. Formalmente, os eleitores escolhem entre programas eleitorais concorrentes. São seduzidos pela bondade das promessas. As eleições são precedidas por um combate sem tréguas no plano das promessas. Os concorrentes rivalizam num concurso de promessas, onde probabilidade de execução se confunde com pura demagogia. Há quem diga que a crise da democracia está muito na fase que antecede o sufrágio: no concurso de promessas eleitorais, os partidos resvalam para a fantasia e o eleitor médio cai no engodo. Daí a escolhas adulteradas por uma visão ofuscada da realidade, influenciada por promessas faraónicas que são o isco mordido pelos incautos, vai um passo só.
Cada vez mais é assim que se ganham eleições. Ao que se junta o comportamento, tão estudado pelos politólogos, de “votar com os pés”, ou seja, quando se escolhe A apenas para impedir B de continuar no poder ou de lá chegar. Como se estes ingredientes falaciosos não fossem suficientes, mascarando a escolha de quem há-de governar, os problemas prolongam-se na fase posterior à eleição. A fase da governação, que repousa no mandato conferido pelos eleitores, deve coincidir com o programa eleitoral dos vencedores. O mandato supõe uma escolha baseada na confiança da maioria. O voto é o processo de intermediação que possibilita a delegação de confiança dos eleitores naqueles que os vão governar. É um contrato. Não é preciso ser versado em leis para discernir que os contratos exigem cumprimento. Senão, os que se afastam do contrato devem ser chamados à pedra.
Por todo o lado, a democracia é demolida pela corrupção do contrato eleitoral. Promessas feitas, promessas quebradas assim que os escolhidos se instalam na casa do poder. O que suscita interrogações: o mandato quebra-se por afastamento das promessas que possibilitaram a conquista do poder? Teriam chegado ao poder caso não tivessem feito as promessas esquecidas? Saberiam à partida que o contrato firmado com os eleitores seria impossível de respeitar, caucionando um embuste de todo o tamanho? Como se sentem os eleitores ao saberem que uma, duas, três cláusulas do contrato eleitoral que tanto os seduziram são promessas vãs? Os que ainda continuam a acreditar na bondade do regime poderão replicar que a desilusão há-de ser o lenitivo para votar com os pés. Quando o contrato é esquecido, esboroa-se a confiança e os eleitores tiram o tapete aos que escolheram na eleição anterior. É uma das virtudes do sufrágio popular: a alternância no poder. Contudo, a teoria não se concilia inteiramente com a prática: no nosso caso, a alternância é sempre entre os mesmos, como se fosse uma escolha entre Dupont e Dupont.
Faz parte da retórica dos defensores da democracia: o desempenho do governo é avaliado no seguinte momento eleitoral. A inquietação que este raciocínio me traz é o longo hiato temporal em que se esvazia o poder de escrutínio dos eleitores. É então que passamos da qualidade de eleitores à condição de governados. De cidadãos activos, empossados no direito de voto, a cidadãos remetidos à passividade – nuns casos complacente, noutros casos revoltada. Ora esta democracia é uma democracia amputada. Principalmente quando a menoridade cívica dos governantes semeia no espírito uma confusão de conceitos: exercer o poder não é abusar dele. Em sítios que vegetam na infância democrática, maiorias absolutas conduzem inevitavelmente ao abuso do poder, com um rosário de exibições de autoritarismo inconsequente.
Os detentores do poder devem estar permanente sob escrutínio. Não apenas de quatro em quatro anos, no momento do sufrágio. É que, desse modo, o escrutínio se esgota no preciso instante em que depositamos o voto na urna. Só resgatamos esse poder muito mais tarde, quando formos chamados de novo a escolher quem vai governar. Faria sentido aplicar as regras que regem a convivência em sociedade. Se o incumprimento de contratos é motivo de censura social, observável pela condenação do infractor em tribunal, o afastamento do contrato eleitoral devia ter a mesma consequência. Alguns poderão torcer o nariz a esta proposta. Dirão: isso traria instabilidade política. Contraponho: pelo contrário, seria o incentivo para os governantes serem responsáveis por aquilo que prometeram. O que é mais grave: um mentiroso ou um incompetente?
O contexto: a seita socialista que prometeu, prometeu e vai governando às avessas das promessas. Dois exemplos, só dos mais graves: IVA aumentado e, o mais fresco de todos, a revisão do código do trabalho. Neste domínio, tanto se opuseram ao código quando estavam na oposição e agora propõem-se revê-lo na ousadia que o anterior governo não conseguiu ter. Sintoma de que somos uma democracia ainda infantil: a impudência compensa, como desconfio que será provado nas eleições em 2009.
Falo dos governos. E dos partidos políticos, que antes de chegarem ao ambicionado cadeirão do poder se desdobram em promessas mil. Formalmente, os eleitores escolhem entre programas eleitorais concorrentes. São seduzidos pela bondade das promessas. As eleições são precedidas por um combate sem tréguas no plano das promessas. Os concorrentes rivalizam num concurso de promessas, onde probabilidade de execução se confunde com pura demagogia. Há quem diga que a crise da democracia está muito na fase que antecede o sufrágio: no concurso de promessas eleitorais, os partidos resvalam para a fantasia e o eleitor médio cai no engodo. Daí a escolhas adulteradas por uma visão ofuscada da realidade, influenciada por promessas faraónicas que são o isco mordido pelos incautos, vai um passo só.
Cada vez mais é assim que se ganham eleições. Ao que se junta o comportamento, tão estudado pelos politólogos, de “votar com os pés”, ou seja, quando se escolhe A apenas para impedir B de continuar no poder ou de lá chegar. Como se estes ingredientes falaciosos não fossem suficientes, mascarando a escolha de quem há-de governar, os problemas prolongam-se na fase posterior à eleição. A fase da governação, que repousa no mandato conferido pelos eleitores, deve coincidir com o programa eleitoral dos vencedores. O mandato supõe uma escolha baseada na confiança da maioria. O voto é o processo de intermediação que possibilita a delegação de confiança dos eleitores naqueles que os vão governar. É um contrato. Não é preciso ser versado em leis para discernir que os contratos exigem cumprimento. Senão, os que se afastam do contrato devem ser chamados à pedra.
Por todo o lado, a democracia é demolida pela corrupção do contrato eleitoral. Promessas feitas, promessas quebradas assim que os escolhidos se instalam na casa do poder. O que suscita interrogações: o mandato quebra-se por afastamento das promessas que possibilitaram a conquista do poder? Teriam chegado ao poder caso não tivessem feito as promessas esquecidas? Saberiam à partida que o contrato firmado com os eleitores seria impossível de respeitar, caucionando um embuste de todo o tamanho? Como se sentem os eleitores ao saberem que uma, duas, três cláusulas do contrato eleitoral que tanto os seduziram são promessas vãs? Os que ainda continuam a acreditar na bondade do regime poderão replicar que a desilusão há-de ser o lenitivo para votar com os pés. Quando o contrato é esquecido, esboroa-se a confiança e os eleitores tiram o tapete aos que escolheram na eleição anterior. É uma das virtudes do sufrágio popular: a alternância no poder. Contudo, a teoria não se concilia inteiramente com a prática: no nosso caso, a alternância é sempre entre os mesmos, como se fosse uma escolha entre Dupont e Dupont.
Faz parte da retórica dos defensores da democracia: o desempenho do governo é avaliado no seguinte momento eleitoral. A inquietação que este raciocínio me traz é o longo hiato temporal em que se esvazia o poder de escrutínio dos eleitores. É então que passamos da qualidade de eleitores à condição de governados. De cidadãos activos, empossados no direito de voto, a cidadãos remetidos à passividade – nuns casos complacente, noutros casos revoltada. Ora esta democracia é uma democracia amputada. Principalmente quando a menoridade cívica dos governantes semeia no espírito uma confusão de conceitos: exercer o poder não é abusar dele. Em sítios que vegetam na infância democrática, maiorias absolutas conduzem inevitavelmente ao abuso do poder, com um rosário de exibições de autoritarismo inconsequente.
Os detentores do poder devem estar permanente sob escrutínio. Não apenas de quatro em quatro anos, no momento do sufrágio. É que, desse modo, o escrutínio se esgota no preciso instante em que depositamos o voto na urna. Só resgatamos esse poder muito mais tarde, quando formos chamados de novo a escolher quem vai governar. Faria sentido aplicar as regras que regem a convivência em sociedade. Se o incumprimento de contratos é motivo de censura social, observável pela condenação do infractor em tribunal, o afastamento do contrato eleitoral devia ter a mesma consequência. Alguns poderão torcer o nariz a esta proposta. Dirão: isso traria instabilidade política. Contraponho: pelo contrário, seria o incentivo para os governantes serem responsáveis por aquilo que prometeram. O que é mais grave: um mentiroso ou um incompetente?
O contexto: a seita socialista que prometeu, prometeu e vai governando às avessas das promessas. Dois exemplos, só dos mais graves: IVA aumentado e, o mais fresco de todos, a revisão do código do trabalho. Neste domínio, tanto se opuseram ao código quando estavam na oposição e agora propõem-se revê-lo na ousadia que o anterior governo não conseguiu ter. Sintoma de que somos uma democracia ainda infantil: a impudência compensa, como desconfio que será provado nas eleições em 2009.
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