6.4.10

Abutres da inveja


In http://www.jorgefrassati.org.br/senior/img/abutre.jpg
Umas pitonisas da moralidade e da ética – Mira Amaral, uma sequela do cavaquismo, e o querido “Tozé” Seguro, deputado do PS que encena alguma rebeldia – andam por aí ofendidos com a pipa de massa que outro ente querido do bloco central, António Mexia, ganhou no ano passado por ser presidente da EDP (merece ser por extenso: três vírgula um milhões de euros).
Em relação ao Mexia da EDP, seu advogado não quero ser, por não o poder ser em relação a quem figura no rol das antipatias de estimação. Explicava os motivos da antipatia se estivesse em causa o Mexia da EDP. Ao contrário do que pensam Mira Amaral e “Tozé” Seguro, não é o salário do Mexia que está em causa: são os denunciadores da pretensa obscenidade em que o dito salário mais bónus consistem. Ao Mexia não era suficiente acontecer o que não acontece à imensa maioria. Nós, sossegados no anonimato, resguardamos os rendimentos da cobiça alheia. O Mexia tem que pagar o preço da devassa por ser quem é (presidente da EDP): mandam as regras da bolsa de valores, os seus rendimentos são públicos.
A EDP ainda é uma empresa de que somos todos accionistas (se todos formos o Estado – o que é cada vez mais duvidoso). O deputado “Tozé” Seguro e o ex-ministro Mira Amaral (que é nesta condição que o abencerragem do cavaquismo tem surgido) abriram as goelas de indignação. Não há direito, nestes tempos de tão intensa crise, que uma empresa de que ainda somos todos um bocado accionistas pague esta alarvidade de dinheiro ao presidente. Os partidos – reclamam as duas pitonisas – deviam tomar o assunto entre mãos. Se o Mexia é ganancioso, alguém corte o mal pela raiz. O accionista, portanto. Se aquela gente na EDP não tem sentido dos limites e aceita remunerações obscenas (para usar o adjectivo cunhado enquanto se soltavam os perdigotos de indignação de um dos inquisidores da paróquia), o accionista que ponha essa gente no sítio.
Interessa-me saber quanto ganhou o Mexia? Nada. Nem que me convençam (o que é improvável) que sou accionista muito minoritário da EDP. Não gosto de mandar palpites se, através deles, ficar exposto aos palpites alheios. Talvez ache mais obsceno (pedindo de empréstimo o adjectivo – mas não os perdigotos) que os jornais façam as habituais contas de máquina de calcular só para anunciarem aos leitores quanto é que aquela pipa de massa significa por dia. Um dia destes, ser gestor ou membro de um conselho de administração é profissão de risco. Vão na rua e têm que ouvir piropos manhosos dos invejosos de serviço.
O que têm Mira Amaral e o deputado Seguro a ver com o assunto? Dou de barato que o deputado, de há algum tempo a esta parte auto-arvorado em consciência ética dos socialistas, possa alvitrar alguma coisa. Assim como assim, é deputado da nação. Nessa condição, podia-se aceitar que tivesse ficado indignado com os proventos astronómicos do presidente da EDP que ainda é um bocado empresa pública. Se o deputado Seguro não tivesse uma agenda própria (aquele constante bicos em pé traz água no bico), dava de barato a sua cólera.
Foi quando ouvi Mira Amaral a chamar a si a superior condição de juiz de ética dos outros que fiquei a coçar a cabeça. O senhor, com fala inflamada e perdigoto abundante, insurgia-se contra a barriga de dinheiro auferida pelo Mexia. Nesta pele de comentador é-nos apresentado como “ex-ministro de Cavaco”. Isto não é estatuto que faça valer a autoridade de um comentário. Eu preferia que apresentassem o senhor engenheiro Mira Amaral na sua actual condição. E o que faz este senhor na vida? Preside a um banco criado com capitais angolanos (da família do presidente do dito país e da oligarquia adjacente).
Os jornalistas, amestrados para o que convém, escutam o engenheiro do banco dos angolanos e não lhe perguntam se o dinheiro que abriu este banco é dinheiro limpo. Ah, os telhados de vidro que enchem de mácula quem se acha juiz da ética dos outros.

Sem comentários: