5.1.12

O bendito do bedelho


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Um longo cortejo de sacerdotes e sacerdotisas (a bem dizer, mais destas do que daqueles). Espiolham as entranhas dos outros. Emprestam os seus préstimos na forma de palpites. Saciam-se na existência alheia. Porventura para olvidar consumições próprias e senescências precoces que se aplacam com a viciante perscrutação das vielas por onde andam as vidas dos outros. Que grande tributo à velha escola das alcoviteiras cuja maleita era terem tempo a mais e instrução a menos, àquela carismática figura da porteira que sabia mais que os agentes da polícia secreta.
Meter o bedelho é instituição venerada. De tanto praticada e por tão afamada gente (que a modernidade esbateu as tangências da instrução como critério de exclusão), dir-se-ia que merece, como o fado, foros de património da humanidade. Meter o bedelho é uma generosidade. Uma comovente generosidade. São os outros e as outras, sacerdotes compungidos, que trazem existências sob escrutínio nas termas da sensatez. Desvarios, uma incapacitada lucidez, o mau feitio, a propensão para o precipício ou apenas a inata condição para tropeçar no erro, podem ser corrigidos pelos afáveis juízes que assistem ao descalabro sentados na tribuna dos sábios. E ai de quem levante voz contra os apaixonados déspotas que fervem nas suas dores de cabeça pelo suplício de verem os tresmalhados a teimarem no erro. Quem se pode contristar pela generosidade que outros praticam sobre si próprio?
Que ninguém se incomode quando se sentir dissecado por um painel de sábios na implacável arte de sentenciar os desatinos cometidos. Escancarem-se as portas aos encartados do bedelho. Estão ungidos por dotes dois dedinhos abaixo do nível divino. Uma clarividência ímpar. E ai dos que insinuem, esses torpes, que os sacerdotes e as sacerdotisas com credenciais para meter o bedelho fogem a sete pés das contrariedades que os trazem no sopé da apoplexia. É a ingratidão no seu apogeu.
Um bem-haja é devido aos diligentes, gentis atores que tanto se incomodam ao meterem o bedelho. Se não fosse por eles, quanta errância não sobejava?

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