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Tropecei
em ti, Pacheco, naquela livraria. Devias andar a desempoeirar os ombros, que me
pareceu estar neles depositada uma fina película de pó, talvez as sobras
acumuladas numa pilha de livros da tua biblioteca. E, apesar de andar mal da
pituitária, senti um odor a bafio das duas vezes que meteste o corpanzil no meu
caminho (já adelgaçado, porém, desde a última vez que te pus os olhos em cima).
A certa
altura pareceu-me que ias acompanhado. Ao teu lado estacionara uma mulher alta,
airosa, curvilínea. Transpirava voluptuosidade. Foram uns minutos, não contei
quantos, mas uns minutos. Vi-te a espreitar pelo canto do olho. Faltava-te a
capacidade dos galináceos que conseguem revirar os olhos e alargar o campo de
visão. É que dava mesmo jeito, tamanho o monumento de luxúria que se deleitava
com um grosso calhamaço nas mãos, talvez sem perceber que eras tu a sua
companhia. Eu entendo que deves ter alimentado a esperança de que a mulheraça
se demorou ao teu lado porque te conheceu. E se há figura pública com largo
reconhecimento, esse alguém és tu. Mas desengana-te, Pacheco. Ela envergava
olhos com fundo de garrafa. Dirias: é sinal identitário de uma intelectual (como
tu). Não podia ser tamanha coisa. Conheces alguma que sintetize os dois
atributos na mesma pessoa?
Suponho
que encheste a vista. Suponho, até, que enfardaste o bucho das fantasias. De
repente, ainda estava a monumental mulheraça inerte ao teu limiar, pareceu-me
que esboçaste umas intimidadas palavras na sua direção. Estarias a largar o
grão à asa em plena livraria? Fiquei na dúvida, esclarece-me: foi apenas um
tossicar lúgubre, ou dirigiste umas palavras remotas, que eu adorava ter
escutado só para decifrar a tua proficiência de galanteador. Mas, ó Pacheco,
que heresia em que te atamancaste: galantear numa livraria é pecado mortal.
Saímos
da livraria ao mesmo tempo, Pacheco. Não por acaso, viraste à esquerda e fui
pela direita.
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