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O habitat hostil. Flagelado por
ventos impossíveis. O gelo amontoado, sinal da dura invernia. Ou o sol
impiedoso na curta, mas feroz, estação estival. Chamam-lhe deserto. Não haveria
senão mortos-vivos dispostos a habitar naquele lugar. E, todavia, por lá andava
o homem rude. Teimosamente residente, impassível perante as travessuras dos
elementos. Selava o exílio interior. Desaparecera de onde sempre fora. Não deixara
rasto. Os que lhe eram queridos davam-no como desaparecido. Quase todos, no seu
íntimo, desconfiavam que perecera sem se saber como. Só um punhado, entre os
que ainda dele se lembravam, julgava que resistia algures, porventura sem
motivos para dar conta da existência.
Lá longe, naquele sítio onde
ninguém cuidava de habitar, persistia o homem rude numa peregrinação de
isolamento. Quando aparecia vivalma – um caçador extraviado, um tresloucado
perdido na sua errância, ou um explorador embebido no sacerdócio científico –
refugiava-se num punhado de rochedos inacessíveis. Não queria conversa com
gente.
Um dia, um explorador extravasou
a curiosidade científica. Insistiu, irritantemente, em estabelecer contacto. O
homem só quisera refugiar-se em lugares que decerto o teimoso explorador não
saberia tactear. Pensou melhor. Se fosse correspondente na procura de
comunicação, podia ser que saciasse a curiosidade e o assunto encontrava pedra
tumular. Não inibiu o desconforto. Não escondeu desprazer, inquietação, antipatia.
Mentiu com todos os dentes. Contou ao explorador que era uma estadia episódica.
À procura de si mesmo. O explorador satisfez a demanda. Não voltou a dar
notícias. O eremita do lugar inóspito resgatara o alívio.
Nessa noite, apoquentado pela
conversa que tivera, devolveu à procedência um ror de interrogações. Continuava
sem saber o que causara exílio tão sacrificial. Era um buraco negro na memória.
Desconfiava que o refúgio naquele lugar impossível era uma covardia apontada
contra si. Os poucos que lhe puseram a vista em cima julgavam que ele era
exemplo de bravura e ensandecimento. E ele discordava, por entre a
autocomiseração pela memória omissa. Temia que dela sobejassem atos hediondos
que o levaram à fuga do mundo inteiro. Não se chama a isso covardia?