12.7.12

Decálogo


In https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgz1-Fdj7y64ouzTqimPaimZNaO9FLTMRt5yIJy3V6iEwGtQeLfqnnvh6uAgyxmAhkHq6qM_Iw4cOfuB8kE0iRv2BD0QOSJkkPlG_v0quTRKFAB2Qmvpts0Vmb6vpgvOdMrg2Qc/s1600/caneta.jpg
1. Não fujas de ti. Não ensaies o que julgas ser, por manhas que depois se devolvem em forma de dilúvio. Não recuses os ventos propícios que espreitam no alpendre, os ventos que ciciam palavras douradas.
2. Arremete contra as ilusões que se esboroam em nadas. Convoca o eu espontâneo, nem que seja um eu remoto pelas divergências com o tempo emoldurado. Terçando armas contra o simulacro de ti que te entretém numa fantasia vertical, como se houvesse outras dimensões dentro do que é tirocínio eterno.
3. Para não fugires de ti, empreende luta contra arremedos que adulteram o teu eu. Cavalga as ondas tempestuosas. Não te atemorizes com o sibilar medonho do vento que empurra contra o teu peito as ondas fumegantes do mar. Deixa o peito rasgado, se preciso for, as cicatrizes à mostra em forma de medalhas.
4. Alisa a areia do deserto por onde teu pés acabaram de transitar. Não interessam os vestígios que teimam na intemporalidade. Ou então oculta os passos deixados para trás, enlaça a cabeça no firmamento onde se aloja o porvir.
5. Enamora-te pelas coisas belas que são do teu mundo. Bebe-as, demoradamente ou de um trago só, deixa falar a vontade do momento. Sacia-te nas palavras de um poema. Detém-te, retoma estrofes anteriores, as vezes que forem precisas. Até que, de olhos fechados, consigas entoar as estrofes. Revê o poema pelo teu punho. Deixa nele transpirar um génio.
6. Volta à casa da partida com tudo por fazer a partir de uma folha em branco. Os dias que interessam começam aí. Renasces.
7. Contraria maus ímpetos, rejeita a pestilência dos conflitos, mete punhais em preconceitos estéreis.
8. Deixa que as alvoradas sejam a imagem de uns olhos quentes que por ti zelam. Não denuncies essas alvoradas.
9. Sê o teu próprio arquiteto. Sem concessões aos traços de outros. Perfuma as resistências de outrora com as pétalas carmim em que te banhas. 
10. E se ao cabo de todas as palavras elas continuam a ter declinação cifrada, não olhes para trás. Deita fora a folha já com profusa prosa. Retira outra, branca, folha. Repete tudo. Agora com palavras que não sejam ilegíveis. Entoa intenções com toda a simplicidade. Para não voltares a fugir de ti.

Sem comentários: