Micah P. Hinson, "The Possibilities", in https://www.youtube.com/watch?v=HRRnosHzdCw
O que somos, se não a têmpera de quem se
não amedronta diante dos sobressaltos? O que somos, se não os pergaminhos da
ambição, pois sem decantarmos os desafios ficamos reféns de um torpor
incendiário?
Os cânones ensinam o possível. Não se
fala do impossível. Deixa-se o impossível aos sonhadores, aos lunáticos, aos
poetas que parecem viver num mundo hermético, aos vendedores de alucinações.
Não – diz-se com redobrada ênfase – o impossível não pertence ao leque das
possibilidades, deve ser banido do léxico das empreitadas. Ou corremos o risco
de fazer par com a fileira de desprendidos que se alimentam do vazio – essa
gente não recomendável. E não queremos, pois não, ó sacerdotes da normalidade?
Não vão os azimutes oníricos despertar assombrações que se acreditavam
hibernadas e que, ao verem outra alvorada, podem tudo inquietar com seu malsão
feitio. A rotina não se compraz com espíritos livres, com a rebeldia de quem
desafia a impossibilidade, pois não, ó sacerdotes da normalidade?
Todavia, somos matéria empenhada aos
sonhos. Por mais que os tutores da possibilidade nos guiem pelo tamanho escasso
por nos deixam mover, somos fautores dos sonhos que nos comandam, dos sonhos de
que somos arquitetos maiores. E enquanto os sonhos se encastelarem, diremos não
à ditadura da possibilidade que encerra o terreno das impossibilidades numa masmorra
escura. Pudera: os tutores da normalidade, tementes do desarranjo do simples arremessar
da impossibilidade, são próceres dos limites por eles entronizados como matéria
aceitável. Vigilantes absolutos, implacáveis para quem ousar a dissidência.
Enquanto houver sonhos por compor;
enquanto houver livre arbítrio que não empalidece diante da tirania dos
próceres das possibilidades; enquanto formos gente de matéria viva e curadores do
pensamento livre; enquanto não nos deixarmos empenhar pela intransigência da
resignação: seremos engenheiros das impossibilidades que nos apetecer, nem que
elas transitem no limiar da transgressão. As proezas são tradução de
impossibilidades que o foram em devido tempo, mas que a destreza dos afoitos
devolveu a diferente território, agora o da possibilidade.
E manteremos a centelha viva, a que nos acende
o vasto mar das impossibilidades. Que só o são até que nos metemos ao caminho
para que o deixem de ser. Pois do nosso engenho tudo depende.
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