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A cidade é tão grande e, todavia, parece
um lugarejo onde se sente assaltado pela claustrofobia. É grande a cidade, com
tantos recantos decerto desconhecidos, mas ele desagua sempre nos mesmos
lugares. Talvez seja garantia contra a novidade, com o temor que os olhos se cegassem
com o efeito telúrico da novidade. A certa altura, a idade descompõe os
sentidos e a novidade é agressora. Mas o tempo começava sempre da mesma
maneira. As alvoradas temporãs faziam sobressair a luz baça através do orvalho
da madrugada, quando aproveitava a letargia ainda a desfazer-se em quase toda a
gente que se convencia para mais uma jornada. As ruas são mais belas quando
estão quase sozinhas, despejadas de outra almas. Quem disse que a solidão é opressora?
O pior era quando assomava a pergunta
habitual: por onde ir, até onde ir? Quando a ousadia tinha emancipação, metia
os pés por caminhos raros. Depressa aportava a ruas conhecidas, a lugares que
eram visitação frequente, entrando nas mesmas livrarias, nas mesmas lojas de
roupa, nos mesmos cafés, olhando de soslaio para os mesmo monumentos. Não era a
rotineira peregrinação que o apoquentava; era saber do lugar-comum que
certificava que os hábitos e sua repetição são doença. Queria arremeter contra
a ditadura dos juízos, dos que se ajuramentam sábios que se julgam
enciclopédicas fontes de saber do saber dos outros. Queria romper com o marasmo
das autoajudas, dos compêndios milagrosos que esboçam as receitas para todas as
maleitas, contra o saber catedrático das regras muito matemáticas sobre a mais
não matemática matéria que é o comportamento dos homens.
As manhãs monótonas não eram o desenho
de estilhaços. Eram o princípio do pensamento que flanava com o corpo que mecanicamente
se arrastava pelas ruas da cidade. Delimitando as fronteiras do território
habitável, como se as ruas e os recantos que eram tão estranhos como qualquer
desconhecida cidade fossem a metáfora do tóxico. Não sentia saudades do
desconhecido. Não reprimia sequer a pulsão da aventura, que o poderia trazer às
fímbrias das ruas singulares que dantes nunca foram visitadas. Era como tinha
de ser. O desassossego com a antinomia do que era, não tinha acolhimento.
À noite, repousava no sono com
desembaraço. Já não era, como dantes, amotinado dentro das fronteiras de si
mesmo. Que maior prova de vida podia ter entre as mãos?
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