2.3.16

As encruzilhadas

Portishead, “Magic Doors”, in https://www.youtube.com/watch?v=VCUtrLn42fc
Sobranceiras ao rio, as estradas corriam paralelas. A poeira levantada pelos pneus deslizava para o fundo vale, murando o leito do rio. As duas cumeadas, uma de cada lado do rio, foram o lugar escolhido para escavar os caminhos de terra. Talvez fosse mais fácil. Na cumeada há planura. Mas a estrada – as duas estradas paralelas – não podia continuar assim até ao infinito. Era possível perceber a finitude das montanhas. Mais à frente, elas começavam a descair, prometendo encontrar o rio.
Um pouco depois, a estrada pedregosa deu de caras com uma encruzilhada. Podia seguir quatro caminhos. Dois deles tinham pareciam fugir do rio. Os outros dois, pelo rumo que deixavam entender, talvez quisessem ir ao encontro do rio. Hesitou. Nem sequer sabia se o rio era a sua demanda, muito menos qual dos quatro caminhos haveria de escolher. À falta de mapa, e na ausência de toponímia esclarecedora dos destinos que dimanavam do entroncamento, meditou sobre o caminho por onde tomaria caminho. Admitia estar perdido. Desorientado. Já não era a primeira vez que tinha esta impressão. Naqueles montes, parecia que os pontos cardeais não quadravam com as indicações do sol.
Tinha de tomar uma resolução. Já estava parado há mais de meia hora e o sol seguia caminho para o horizonte. Não era sensato ter a noite por companhia num lugar ermo e desconhecido. Decidira atirar-se pelo caminho que parecia ter ramificação com o rio. Hesitou outra vez. E se o caminho fosse desaguar a um cais improvisado, sem ponte que deixasse passar o rio? E se a travessia do rio o levasse a outra encruzilhada mais remota? A travessia do rio não era caução de saída do labirinto em que se metera.
Já chegava de tergiversações! Meteu pelo segundo caminho a contar da direita (para quem via a encruzilhada de frente). Começou a descer. Era uma descida íngreme, denotando proximidade gradual com o rio. Todavia, não conseguia deitar os olhos no rio; à sua direita, continuava a ver montes cheios de pedra e sem vegetação. A certa altura, o terreno nivelou-se. Terminara a descida e já era possível conviver com arbustos e árvores rasteiras. Outra indicação de que o rio estava próximo. Um rumorejo distante confirmava a impressão. O ruído ficava mais claro, mais próximo. Até que encontrou o rio. Já não era um fio delgado de água a escavar um vale profundo entre as duas cumeadas. Levava mais caudal.
À frente, encontrou um cais rudimentar onde aportara uma barcaça. Perguntou ao marinheiro onde encontrar a localidade mais próxima, agora que o entardecer dera lugar à ainda tímida noite. O marinheiro respondeu que tinha de subir a estrada – a mesma estrada por onde viera. Ao chegar a um cruzamento de quatro caminhos, devia seguir pelo caminho que estivesse mais à direita. Depois era mais meia hora de caminho.
E ele percebeu que a sua intuição não era de confiar.

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