CocoRosie, “Lemonade”, in https://www.youtube.com/watch?v=tu3EcAHdHlE
Ah, esta febre de
mudança! Esta inquietação com o estabelecido, porque o estabelecido está
caduco. Ah, as fontes novas de onde jorra o ouro líquido! E as vozes de um coro
de crianças que, julga-se, entoam cantorias diferentes (quando afinal se trata
de uma repetição). E, ah!, os planos tão embelezados com as cores enfáticas que
assinalam a diferença, quase fazendo acreditar que os tempos prometidos têm uma
espessura diferente dos já experimentados.
Mudança de planos.
Podemos estar convencidos da decadência arquipélaga e de nós sermos a imagem
sumptuosa de uma ilha que se exilou da decadência. O voluntarismo fermenta
outra convicção: cada um, como ilha infinitamente minúscula, têm nas mãos os
mágicos poderes para congeminar a mudança, para arrematar a decadência e
emoldurá-la num lugar onde se comente a arqueologia. Mas não somos nada disso.
Não somos heróis, nem o tamanho que há em cada um de nós chega para incendiar a
fogueira onde queremos que ardam todos os sedimentos da decadência. Metemos
travões a fundo. Afinal, nem sequer importa a decadência que anotamos nos
outros (sem cuidarmos de saber se ela não é também predicado nosso).
Travões a fundo. Sem pactuar
com os odores fétidos, com as salas alquebradas, com as janelas pútridas, e com
todos os arquitetos dos lugares e do pensamento com aversão à mudança. Deixamos
o lugar do conservadorismo para os outros, sem chegarmos a perceber se também o
habitamos. Não importa. Não importa. Os outros deixaram de ser matéria de
relevância. O mundo lá fora, também.
Por isso metemos os
travões a fundo. E aceleramos por uma estrada porventura vazia; não queremos
saber se transita mais gente por esse caminho, desde que aquiescemos que nos
enche as medidas e deixa o sono deitar-se numa alforrada macia. Na exata medida
que metemos travões a fundo, aceleramos para o madrigálico que encontramos por
dentro de nós. Aceleramos. Com critério. Umas vezes com a suavidade da
aceleração discreta. Outras vezes, quando quisermos, metendo a fundo o
acelerador que dá lume à vertigem necessária.
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