The Sound, “Silent Air”
(live), in https://www.youtube.com/watch?v=NYyYJOwVlKk
Apenas o rumorejo do
mar. Apenas a centelha da noite. Apenas o sibilar dos pássaros. Apenas o
murmúrio do vento ouvido nas cumeadas. Apenas o compasso da chuva fina. Apenas
a cantoria das ramagens quando o vento as descompõe. Apenas o ruído surdo da
luz noturna, como se à volta todo o ruído se resumisse à sibilina luz da noite
e aos segredos que esconde. Apenas a melodia da maresia. Apenas as palavras ciciadas
na leitura de um poema. Apenas o silêncio.
Apenas. Pois o
silêncio é a medida larga das ideias que precisam de proporção. O estatuto de
um refugiado dos ruídos vários que emprestam cidade à cidade (não fora cidade sem
esses ruídos). A medida do preenchimento das hesitações que se alinham no
firmamento. A cura para as resoluções que pendem com a sua gravidade. Ou,
apenas, um recolhimento temporário, como se de um sono se tratasse sem o
embotar dos sentidos, para arrumar nas devidas gavetas o que se houver achado
desarrumado.
Mas o silêncio é
também de palavras afirmadas. Através de um silêncio metódico, de um silêncio cúmplice
entre duas pessoas que cultivam cumplicidade. Um silêncio através de um olhar
comprometido decifra-se em palavras, em sentimentos, em desejos. Em
impossibilidades momentâneas. Ou no desenfrear dessas possibilidades. Pois o
silêncio é penhor da grandiosidade de palavras que se sentem e que não precisam
de ser ditas num certo momento. Elas entretecem-se nos silêncios, como um silvo
profundo de infrassons. O silêncio não esconde segredos. Pois o embaciamento
das palavras ditas não renuncia às palavras intuídas, mercê de um silêncio
colocado no momento certo.
O silêncio pode ser
temporária reclusão, um fechamento por dentro de si, quando as mãos que
tergiversam precisam de refazer as coordenadas. Para reescrever um texto que
ficou a meio. Para retomar a avenida, entretanto desistida. Para desalfandegar
uma ideia adiada. Ou, apenas, porque o silêncio se impõe na penumbra, antes que
as trevas o tornem perene.
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