Pixies, “Gigantic” (live), in
https://www.youtube.com/watch?v=xJncHEZ3URs
Florença. Uma joia sublime. Feita de casario antigo,
colorido, às vezes decadente. A cidade que acompanha os humores da orografia. Deitando-se
nas colinas, espreitando sobre a lonjura onde se espraia a bucólica paisagem da
Toscânia. Um esboço de história vivente. Um museu a tempo inteiro. E a Ponte Vecchia sobre
o rio Arno: onde o tempo não tem tempo e apetece demorar o tempo que for
preciso.
Londres. Apressada. Aristocrática – penhor que, mesmo a
alguém a quem a aristocracia é improcedente, calha a preceito em Londres. Os esquilos
em St. James Park que vêm comer à mão
das pessoas. Os oradores lunáticos e os oradores inspirados com audiência no Speakers’ Corner. O mercado de Portobello aos sábados de manhã. O lamacento
Tamisa, companhia enremissada quando os pés se arrastam na sua margem. A cidade
tão cosmopolita que o londrino genuíno se tornou uma amálgama de culturas.
Barcelona. As ruas estreitas para lá das Ramblas, onde se escondem os segredos da
cidade. A esquadria perfeita das ruas, com a bissetriz da avenida diagonal. A rutura
da arquitetura de vanguarda, que convoca um olhar inconformado, um sobressalto
sem sono. O pulsar extravagante das pessoas. A fartura de Barcelona quando a
cidade é esquadrinhada desde o miradouro no Montjuich.
As tapas. O sentido independentista na cidade plantada no mapa de Espanha que é
um animal selvagem sequestrado dentro de uma jaula.
Lisboa. A luminosidade singular. O sobe e desce de ruas
apertadas, o cheiro a fado na genuinidade das gentes típicas. O Tejo que se
abre ao mar, fundindo-se com ele no Braço de Prata. Os elétricos, ícone celebrizado
por cineastas e escritores estrangeiros que se enamoraram da cidade. Os bairros
típicos, onde parece que o tempo não correu a sua marcha e um passado,
imortalizado em cinema, se cristalizou.
Paris. A cidade que transpira amor por todos os poros. Nas
esplanadas de café que são vivos postais ilustrados. Nos recantos de Montmartre, onde apetece escrever poemas.
No rio Sena percorrido pelos bateaux-mouches, o rio levando as águas que lavam as
almas. Nas ruas interiores do Quartier Latin, que escondem pequenos
pedaços de éden. Na avenida dos Champs Elysées, ao descer em direção à torre
Eiffel. Onde as árvores que bordejam os passeios são um tapete solene que é chão
nupcial de que os amantes recolhem rudimentos para serem ainda maiores no
enamoramento.
Berlim. A rigidez germânica atravessada na
impassibilidade do terreno, infinitamente plano. As avenidas largas. Berlim
oriental, monumental e recuperado. Berlim ocidental, pós-moderno, redesenhado. Os
jardins a perder de vista, com ordenação metódica. O lado emotivo do Check Point Charlie. O simbolismo da Porta de Brandenburg. E a lembrança dos
crimes da guerra-fria nos pedaços sobrantes do muro que pôs os dois lados da
cidade a viver de costas voltadas.
Porto. A minha cidade, testemunha do meu parto. Granítica
e rústica. A cidade do subsolo pétreo, a tal de que se dizia ser impossível
albergar um metropolitano nas suas entranhas. Onde os impossíveis se
transfiguram. Hoje: turística, talvez turística de mais. As pontes sucessivas
que trazem Gaia até ao Porto. O abraço do Douro às duas margens, cortando uma
garganta tão perto da sua foz. A cidade que encanta quando os olhos nela se
deitam desde a outra margem do rio. O Porto com sede do entardecer ímpar. A cidade
exagerada – ou das gentes que se exageram no diagnóstico que fazem da cidade. Ainda,
o meu porto de abrigo.
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