23.5.16

Teoria do entendimento das coisas

Nine Inch Nails, “The Day the World Went Away”, in https://www.youtube.com/watch?v=y7fsHtkNU7w
As coisas têm o seu entendimento. As coisas simples, mundanas, acessíveis a quem conseguir articular raciocínio. E há as coisas complexas, que exigem perícia de entendimento. Na vulgata da opinião democratizada, estamos no modismo em que todo o cidadão tem o direito de opinião sobre o assunto, qualquer que seja ele, oferecido à pública discussão.
Não há grande mal que assim seja. Antes cidadãos empenhados na pública discussão do que um grupo anémico, sem ideias formadas sobre grande parte dos temas atirados para a praça pública. O mal está algures: na propensão para alguma gente ter de si uma imagem maior do que a devolvida pelo espelho, debitando assertivas ideias sobre todo o assunto que se mexa, até dos que convocam conhecimentos periciais dada a sua complexidade. Essas pessoas alvitram, prolificamente. Na maior parte das vezes, com uma superficialidade confrangedora para elas mesmas. Sentam-se numa suposta cátedra (de que apenas cada um destes hiperbólicos catedráticos tem conhecimento) e exercitam o direito a opinar.
Na maior parte das vezes, quando o assunto opinado verte a complexidade que não aconselha tratamento pela rama, têm opinião célere. Apoiam-se numa teoria do entendimento mínimo das coisas. Sobre elas julgam praticar uma decantação milagrosa que as extirpa da sua complexidade genética, assinando sentenças categóricas. Em sendo tais coisas objeto de complexidade, não se julga procedimento capaz sobre elas ter um entendimento superficial. Pois por baixo da fina demão decapada pelos teóricos das inanidades, está a parte mais substancial, o lastro das coisas na sua irremediável complexidade. Os ideólogos da singeleza das coisas complexas tropeçam numa contradição de termos. Mas que ninguém lhes aponte o dedo, que, detentores de uma sapiência suposta e acima de suspeitas, tratam de cavar mais fundo a cova onde já estavam deitados e asneiam argumentos.
Houvesse quem os chamasse à parte e os convencesse que a prolífica autoria de opinião sobre todo o assunto que se mexa, e em particular dos que têm pergaminhos complexos, não os deixa vistosos no retrato. E houvesse quem os convencesse que, diante de complexas coisas, das duas, uma: ou mergulham em leituras para terem algum conhecimento de causa sobre a coisa e só depois arriscam opinião debruada com a advertência da prudência, que não cauciona conclusões contundentes e definitivas; ou praticam o silêncio metódico, pois a coisa, de tão complexa, exige opinião informada. Assim manda a teoria do entendimento profundo das coisas.

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