Ty Segall, “Warm Hands
(Freedom Returned) (live on KEXP), in https://www.youtube.com/watch?v=o-CofEQ4iao
Como nas quinhentas milhas de Indianápolis: as rotações
no máximo, a todo o tempo. Sem descanso. Sem intermitências. Com o ponteiro a
beijar o red line. Não há tempo a
perder. As hesitações podem assemelhar-se a destempo.
Oxalá a corpo pudesse prescindir do sono (não
pode). Pau para toda a obra que viesse ao regaço do conhecimento, das experiências
com visibilidade para o conforto, ou das que apetece experimentar só para saber
a cor que trazem por dentro depois de desembrulhadas. Sempre com o pé a fundo
no acelerador da vida. Uma corrida de fundo, é certo, mas à velocidade toda. Vertiginosamente
açambarcando os fragmentos de que se compõe uma vida. Tornando-a inteira. Enxugando
as inúteis derivações que não provêm ao sustento da alma. Sem medo dos
sobressaltos – um risco necessário em caso de tanta voracidade contaminar a matéria
das veias.
Não sobra alternativa – a não ser que o destino
seja a capitulação e os comandantes supremos que apascentam a letargia saibam
convencer que o sopor é bom conselheiro. Mas não é isso que queremos. Não queremos
ser gente despojada de rosto próprio. Não queremos ser despojados do ADN
singular e tornados iguais à multidão. Não queremos ser acantonados a um anónimo
lugar onde somos deixados à míngua de vontade. Onde deixamos de ser o que nos
apetece só para não ousarmos desafiar os cânones e quem os tutela. O prazer de harmonizar
os prazeres pode não quadrar com a hipoteca da alma, em caso de ela se render à
tirania de uma crença. 12.000 rpm e somos hedonistas. Não queremos saber do dia
que vem amanhã. Não queremos saber da hora seguinte.
Esgotamos, até à medula, as pétalas oferecidas
pelas flores, os centímetros que nos separam do sopé da montanha, todos os gramas
da matéria em que a vontade se funde, as páginas já lidas e as que nem sabemos
que iremos ler. Deixamos para os eclesiásticos o seu cinto de castidade e para
os aspirantes à beatificação o lugar próprio e a água benta necessária, que é
coisa que dispensamos por a considerarmos crime contra o sumo apetite de que
somos depositários. Correndo contra o tempo para, por dentro dele, o podermos
retardar quando apetecer e apressá-lo quando tivermos em juízo que está
madraço.
12.000 rpm. Havendo motor.