7.7.17

Badchester


Grizzly Bear, “Mourning Sound”, in https://www.youtube.com/watch?v=uAdbs-VdcdI
Tutela da impiedade, ou apenas um refúgio contra os reveses sofridos? Não se sabia. Aquele lugar era só composto por rapazes maus. Só os rapazes, que os mais velhos e as mulheres (independentemente da idade) não cursavam tais impreparos. E não se sabia se a anomalia residia nos rapazes destrambelhados, ou se era a impressão digital que advinha aos mais velhos quando se desprendiam da estroinice adolescente. Enquanto os curiosos pela hermenêutica das almas instruíam a separação etária e o entendimento das diferentes linhagens, os maus rapazes teimavam em ser amanuenses da perfídia.
Desdiziam-se com o deleite de quem rompe juras – e, em alguns casos, juras que levavam o selo da solenidade, que essas eram as que mais prazer granjeavam no momento do incumprimento. As vítimas das juras fracassadas bem podiam protestar, até podiam vociferar os impropérios mais ultrajantes, que os rapazes se enchiam de brios e entregavam-se ao puro deleite da contravenção assinalada. E se um valente prometia esbofeteamento em paga do não respeito da jura, era o que mais alento dava ao estroina insensível para ser aina pior.
Os maus rapazes eram recetadores dos maus instintos que sondavam nos outros. Quando sentiam esgotar-se o manancial de más ações (assim ostracizadas pelos cânones tidos como aceitáveis), muniam-se de um radar imaginário que indagava, junto das pessoas que coincidiam nas imediações, se estavam possuídas pela pureza da malvadez contudo reprimida pelas exigências ditadas pela “boa convivência social”. No fundo, tratava-se de sorver, através de mecanismos insondáveis, a pureza da impureza que residisse no âmago dessas pessoas; no fundo, tratava-se de repristinar o que foram na altura em que transitaram pelas faldas da crueldade, nos anos inconsequentes da juventude.
Eram os maus rapazes que espalhavam a confusão entre os bons samaritanos que defendiam o “bom funcionamento da sociedade”. Estas intenções eram nauseabundas, no parecer dos maus rapazes. Não acreditavam na bondade, que entendiam como um estado de alma contrariado pela mais funda essência da espécie humana. Havia quem os denegrisse com a acusação de misantropia. E os bons rapazes, apesar de tal palavra ainda não ter vindo ao bornal do seu vocabulário, não se incomodavam; era tudo o seu contrário, com uma excitação sem meças, tomados por um instinto irrefreável para serem ainda piores do que pintados eram pelos próceres da “boa sociedade”.
Um dia, um sacerdote dos bons comportamentos instou-os a fazerem um exame de consciência, na véspera das maldades que se preparavam para no sacerdote cometer. Riram-se desalmadamente. Demoradamente (o que era boa notícia para o sacerdote, adiada pela demora do riso a tortura assim desagendada). Um dos maus rapazes saiu-se com esta resposta: “se temos um sono sereno, sem ser assaltado por insónias ou pelo desassossego de pesadelos inquisitoriais, é critério cabal para o teu desafio?
Mas um dia acontece a todos os rapazes deixarem de o ser. Numa transfiguração semelhante à lagarta que se torna borboleta, perdem os esteios da maldade e, por mais que queiram, já não têm mão nos maus instintos de que se ufanavam na véspera. Afinal, Badchester não é totalmente Badchester.

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