5.2.25

Por alturas do subsolo

Ólafur Arnalds, “Written in Stone”, in https://www.youtube.com/watch?v=wJRbjY8Hd6w

A matéria incansável ateia o encantamento pelos sortilégios que ganhamos ao acaso. Não são súbditos os que assumem a empreitada. Alguns tornam-se mecenas, despojam-se de haveres para que muitos possam fruir das criações que outros deixaram em legado para um futuro intemporal. 

É como os investimentos que não têm juros como paga. Ascendem como trunfos imateriais. Para se ter vocação, não se aceitam os modos habituais viciados no cálculo oportunista, numa aritmética estreita que não alcança tudo o que pelo caminho foi desmaterializado. Não é à toa que reumanização das pessoas é arbitrada. Não é criminoso supor a própria essência das pessoas, que parece errar por paradeiro incerto. 

Os fogos que se ateiam são mnemónicas para a memória não ser erradicada. A educação fugiu do seu pedestal; os interesses mutantes são tão válidos como outros quaisquer, do mesmo modo que ninguém pode ser censurado por escolher uma certa trincheira. Podíamos, talvez, reservar o olhar para o nosso interior. Fazer a síntese entre o devir gregário e um aceitável ensimesmar que recusa revistar os outros. Quem não quer ser atirado para o banco onde é sujeito à sindicância dos outros deve fugir da censura dos demais. A lisura fundeia-se na reciprocidade (amiúde esquecida).

Se usarmos as mãos para escavar o passado, o tempo gasto não é inútil. Somos uma linhagem do presente que não se dissolve no tempo passado, por mais que se diga que, por ser passado, prescreveu. Sermos devedores do passado não se confunde com nostalgia. A fina camada do tempo que interessa é aquela que depressa se inventaria como prescrita por ser titulada pelo passado. Há todo um subsolo escondido, mas cuja existência é fundacional para termos um chão robusto onde assentar a existência. Os diferentes tempos combinam-se numa constelação de contradições. 

As pessoas assustam-se com as suas próprias contradições. Por isso, são expeditas a denunciar as contradições dos outros. Devia haver uma lei geral a proclamar o direito irrenunciável às contradições – uma lei com força de Constituição. Era tanta a acrimónia que se poupava, tantos os recursos aforrados em empreitadas inúteis, que a confirmação da felicidade geral dispensava a execução de outras provas. 

Essa seria uma lei que dispensa a forma escrita. 

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