Cocteau Twins, “From the Flagstones” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=L8qqOBWKluM
Uma montanha russa atrevida, o corpo numa constante convulsão, atirado de um lado para o outro como se os órgãos internos se deslocassem do lugar numa agitação sem peias. O navegar tumultuoso que fermenta na tempestade iracunda, uma cordilheira de ondas medonhas sucessivamente fendidas pelo navio exposto à tortura para que foi criado, os corpos dos marinheiros todavia indiferentes em virtude do hábito. As conversas interrompidas, argumentos encavalitados descontinuando o fio condutor do raciocínio de cada um, o fio condutor da conversa entre os convivas atiçados pela irritação, os corpos fervendo na impaciência que ganha um ponto de ebulição com a transgressão do código de conduta das conferências entre pares. Um repto sufragado nos corredores do labirinto interior, fazendo pulsar a angústia pelo tamanho da empreitada sem saber se vai ser cumprida, os corpos sitiados por uma apneia dos sentidos que os deixa no limiar da hibernação. Um insulto mal terçado, que não é insulto por quem o habilitou em palavras com outro significado, mas é desse modo interpretado por quem o ouve, num aquecimento global dos corpos que se encolhem de preconceitos no levedar da tresleitura das palavras ditas. O paradeiro incerto que tem cais na geografia sem lugar, como se todos os mapas tivessem sido extintos e as bússolas estivessem desativadas, os corpos órfãos de identidade, errantes, indiferentes aos abismos que apareçam no caminho. Os corpos que se tocam inadvertidamente, causando uma repulsa irreprimível como se tratasse de uma beligerante invasão de território, sem cuidar de se apurar se foi um raspão sem intencionalidade ou uma ação provocada por um voyeur da intimidade dos outros. Os corpos, ora transidos, ora indolentes, albergues dos outros na anónima procissão que se perfila no vetusto bordão do tempo. A matéria-prima das bolandas, o equinócio do contrabando das almas.
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