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Um dia como se fosse Londres. O
nevoeiro não se cansou da manhã. Demorou-se. Beijou a cidade, como se os
edifícios e as ruas e as pessoas estivessem à míngua de água que quase não
molhava. Não era uma réplica de Londres: faltava a temperatura desses dias de
caligem. Não era pelo fenómeno atmosférico que o pensamento fazia as suas
divagações. A cor da cidade, imersa na névoa teimosa, transfigurou-se. Ela
estava refém da melancolia que dispara quando o teto de nuvens desce até beijar
o solo. Os rostos andavam acabrunhados, os olhos pareciam um mar de
consumições. Havia um cansaço do dia que se arrastava vagarosamente na exata
medida da demora do nevoeiro. “É estranho
como o clima se apodera dos comportamentos”, observava à medida que os
rostos prostrados vinham de frente. A meio do dia, alguém disparou: “este tempo é imagem da crise que não nos
larga.” E, todavia, talvez não houvesse motivos para a declinação da
alegria: “ao menos as cores que tingem a
cidade são diferentes”, ajuizou. São um hino à diferença, a ferramenta que eviscera
a monotonia. O outono já entrara no calendário, mas estava relapso no resto. Um
dia tão londrino era o conforto de um outono poltrão. Só faltava a temperatura
a preceito, mais fria. Mas ao menos houve tempo para redescobrir as ruas e as
casas embebidas numa tonalidade diferente. Não eram as mesmas cores de dias
chuvosos, plúmbeos de outra estirpe. Um lençol de finas gotículas abraçava a
cidade toda e esta contemplava, admirada, a persistência do lençol. Fora um dia
plúmbeo, também, mas por entre a finura da névoa em sucessivas camadas deitadas
sobre a cidade, menos plúmbeo. As gotas avoaçavam mesmo na ausência de vento,
tombavam com a mesma lentidão com que o dia percorria o tempo. Das árvores, a
prova da humidade fazia-se notar no gotejar lentiforme. Em divergência com a
maré dominante, este nevoeiro teimoso fora caução de um contentamento inaudito.
Pois se é tão raro termos londrinos dias esboçando uma das caretas do outono.
E, ao menos, nestes dias o olhar fica embaciado pela densa neblina. O que
convém, vendo os dias que estão.
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