25.10.12

Maresia


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Os golpes sem punhos de renda. Os golpes que atravessam a pele e enfeitam a dor. Fruto do tempo sombrio que deixa atrás de si o desassossego. Não capitulemos. Seria o maior tributo aos que espalham as armadilhas onde querem que nos deitemos. Em vez disso, esquadrinhemos por entre as sombras até descobrirmos uma centelha, um lugar qualquer onde o ar sobrante seja respirável. Se preciso for, persistiremos na demanda, errando pelas quatro partidas do mundo até o ocaso do dia não ser o anúncio da noite que tinge o pano de fundo. Contemplemos o mar que se põe diante dos olhos. Deciframos a coreografia das ondas que beijam os rochedos tão gastos. Vemos como as águas se agigantam, como somos tomados pelo medo quando o mar se enfurece sob a égide do tempo outonal. Temos medo – e depois? Haja, ao menos, a coragem de admitir o medo que se supõe em cada alvorada, o temor de que alvoradas tardias sejam oráculo de escureza absoluta. O passado é que está errado e agora estamos convocados para pagar, com corpo e sangue, as faturas dos desatinos de outrora. O ar plúmbeo é o sinal dos fogos irremediáveis que são a consumição de muitos. Até lá, e antes que seja tarde, oxalá possamos sentir a maresia. Oxalá saibamos o que é ser peixe através do odor da maresia, um bálsamo que nos transporta para o longe que é o idílico lugar com cabimento. Fechemos os olhos, as finas gotas salgadas ungindo as pálpebras, o cheiro forte a mar tomando conta de nós por dentro, e os pensamentos como nómadas, sem freio. Sem desnorte. Regulados pela maresia formosa que embeleza a alvorada enriquecida pelo nevoeiro. Das profundezas do mar há de surgir uma musa que dirá os segredos que queremos ouvir. Ou aos nossos pés no areal molhado depor-se-á uma velha garrafa de onde resgatamos os segredos escritos num papel amarelecido. E que não nos acusem de egoísmo se os guardarmos no regaço que somos, pois esta maresia não aproveita a mais ninguém.

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