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Será que se nos mede o mau carácter
pelas vezes que fomos insultados? Pior: quantas vezes fomos insultados pelas
costas? E interessa sabê-lo – que algum hipócrita alinhavou umas palavras que,
soubéssemos delas mercê do sentido auditivo, ficaríamos ofendidos? Estas
perguntas são inúteis. E mais inúteis são as respostas. Como inútil é o
insultado condoer-se. Do lado de quem fica iracundo e berra um insulto, há a
necessidade de destilar o fel que mortifica o fígado. Se ficar melhor depois do
insulto, o insultado sabe que contribuiu para o bem-estar de alguém. Ser
insultado é um ato de generosidade. Do lado de cá, recebe-se o insulto. Com
paciência. Sem perder a pose serena. Sei de alguns que logo diriam,
parafraseando o povo que não perde oportunidade para inventar adágios a
preceito, “quem não se sente não é filho de boa gente”. E que a um insulto se
deve ripostar. Discordo. Um insulto não merece que se perca o olhar. De frente
para um insulto, os olhos só podem fazer isto: ou se viram para o outro lado,
deixando o insulto a macerar na sua irrelevância (porque é um delírio de quem
insulta); ou continuam virados para o outro lado, porque o insulto é
consequente e fizemos por o merecer – assim como assim, santos não os há na vida
terrena. Um insulto nunca é coisa avulsa. As palavras que insultam são, como
sabemos, pesadas na balança que mede as consequências do que vai ser dito. É
por isso que até os ateus, aqueles que o foram desde nascença e os outros que
ao ateísmo se entregaram com o curso da idade, devem aplicar um princípio
cristão: diante de um insulto, dar a outra face. Perguntar, a quem insulta, se
não quer aproveitar para proferir mais um insulto (como se os insultos
estivessem em saldo). E depois cada pessoa vai à sua vidinha. O insultado vai
mais rico, porque uns atributos (pouco recomendáveis) foram adicionados à sua
repleta personalidade. E quem insultou, aliviado por ter insultado.
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