9.10.12

A prestidigitação de um amanhã


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Aqui na terra vamos tristes para a alegria.
Ah, as peias do porvir, indomáveis. Elas reservam as insondáveis cores que tingem o tempo de então. Dizem que o navio meteu água e vamos naufragando devagarinho. Os pés meteram-se numa estrada alucinada. Gurus de dantescos teatros advertem que o caminho tresloucado não tem regresso. Daqui não saímos, nesta voragem que desce a ladeira inclinada. Ou saímos, dizem, se demandarmos terra ignota (recado aos mais jovens e aos que, em não o sendo tanto, visitam o viveiro da inatividade involuntária). Haja um lampejo de fulgor que abasteça de ânimo os dias que hão de ser alvoradas. O maior conforto é que os dias de outrora não voltam a ser. Possamos emudecer na tristeza de agora para arrematar um amanhã luminoso. Possamos, ao menos, não afogar em aguarrás o lampejo escondido atrás da densa cortina de nuvens. Vamos tristes porque os tempos não estão para festanças. Para onde quer que olhemos, só um teto plúmbeo que ameaça desabar em nós. Mas sabemos, os elementos assim ensinam, que não há tempestade que sempre dure. E repito: a maior dádiva do tempo ainda ausente, do tempo por fazer, é leiloar numa moldura o tempo que deixou de ser. E não venham os tutores da nostalgia querer o resgate desse tempo. Reaver o tempo já gasto é ofensa ao que o tempo nos há de segredar quando decidir sê-lo. Saibamos esperar por ele. E saibamos ser penhores do que nos reservam os sobressaltos dos agoras em que nos consumimos, por mais insuportáveis que sejam, por mais desesperançados se ajuramentem. A luminescência prometida, por ora indistinguível, convoca o traço fino da tristeza quando os dias se compõem num novelo de pesares. Guardemos num cofre os rudimentos da alegria que se promete nos dias que um dia o serão.

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