11.2.05

Não, não é homofóbico!

Juro que a peça de hoje nada tem a ver com a OPA encapotada do lobby gay ao poder político. Nem é expressão de hostilidade contra a homossexualidade. Aliás basta vasculhar no arquivo do blog para encontrar escritos favoráveis aos direitos dos homossexuais. Essa posição explica-se pelo princípio metódico de respeitar a liberdade individual, de aceitar as opções – quaisquer que sejam – das outras pessoas. Sem as menosprezar, nem as aviltar, ou sequer tratá-las com um cunho de discriminação positiva que remete os heterossexuais para o estatuto de desigualdade.

Não me choca ver dois homossexuais em público, em afagos que a sociedade conservadora em que vivemos decerto estranhará. Não me choca, quando ando pelo estrangeiro, ver dois homossexuais de mão dada na rua, exibindo carinhosamente o sentimento que nutrem um pelo outro. Não me choca ver, num restaurante do Bairro Alto, um casal de homossexuais numa deriva romântica em plena mesa, com gestos afectuosos que se vão perdendo de vista entre homem e mulher. Nada disto me choca. O que já me causa incómodo é ser eu o alvo da cobiça homossexual.

Passo a explicar-me. Isto acontece mais quando estou no estrangeiro. De vez em quando, noto olhares indiscretos que se fixam em mim. Olhares que vêm de homens, imagino que homossexuais. De outro modo, porque teriam a necessidade de disparar esses olhares perturbadores? Acontece na rua, ao cruzar-me com as pessoas que passam, num comboio, com a pessoa sentada à minha frente, até em aeroportos, nos momentos de espera entre dois aviões.

Ao início inspecciono-me de cima a baixo. Pode acontecer que esteja de braguilha aberta, ou que tenha a camisa rota, ou uma nódoa gigantesca nas calças. Esperançado que uma daquelas hipóteses explique o olhar persistente, ensaio a inspecção meticulosa. Como se dá o caso de nenhuma daquelas hipóteses se confirmar, só encontro uma explicação: a cobiça alheia, uma cobiça que incomoda porque é feita de olhares que buscam uma certa intimidade. A solução é a fuga, discreta. Sem alardes, para não ferir susceptibilidades.

Confesso o incómodo que a situação provoca. Como disse há pouco, não me causa estranheza ver dois homossexuais assumir a sua condição em público. Já me perturba saber que eu, heterossexual convicto, sou o alvo. Como diz um amigo meu, nada contra os homossexuais desde que não se lembrem de me meter ao barulho.

Esta é daquelas cobiças que faz mal ao ego. Sem que haja qualquer manifestação de homofobia nesta afirmação. Apenas o sentimento de desconforto que me percorre ao saber que do outro lado está um olhar masculino que vai para além na normalidade. Estou no meu direito, o direito de repudiar as abordagens por sinais codificados (porque consta que o mundo gay se desdobra em mensagens codificadas, numa linguagem que só eles conhecem), por não me rever nessa opção de sexualidade. Sem que nisto se possa ver o mínimo laivo de homofobia, repito. Sob pena de estarmos mergulhados na tendência actual que repisa a discriminação positiva a favor dos homossexuais, desvalorizando os direitos exactamente iguais dos heterossexuais.

Mal de mim, cobiça de sensíveis almas que cultivam uma sexualidade diferente. Mal passageiro, resolvido com a estocada final de ignorar os olhares convidativos que surgem do outro lado. Ou a simples ignorância, ou um olhar fulminante de desdém, chegam para matar à nascença a abordagem. Fica apenas o desconforto. Mais ainda de dar conta que o charme do escriba é pouco popular entre o sexo feminino, pois nunca estas abordagens partiram de mulheres…O que até acaba por ser bom. Agrilhoado aos deveres monogâmicos, até agradeço que os olhares indiscretos nunca tenham partido de heterossexuais femininas!

1 comentário:

Lobby Queer disse...

Juro que a peça de hoje nada tem a ver com a OPA encapotada do gado hetero ao poder político. Nem é expressão de hostilidade contra a heterssexualidade. Aliás basta vasculhar no arquivo do blog para encontrar escritos favoráveis aos direitos dos heterossexuais. Essa posição explica-se pelo princípio metódico de respeitar a liberdade individual, de aceitar as opções – quaisquer que sejam – das outras pessoas. Sem as menosprezar, nem as aviltar, ou sequer tratá-las com um cunho de discriminação positiva que remete os homossexuais para o estatuto de desigualdade.

Não me choca ver dois heterossexuais em público, em afagos que a sociedade conservadora em que vivemos decerto estranhará. Não me choca, quando ando pelo estrangeiro, ver dois heterossexuais de mão dada na rua, exibindo carinhosamente o sentimento que nutrem um pelo outro. Não me choca ver, num restaurante do Bairro Alto, um casal de heterossexuais numa deriva romântica em plena mesa, com gestos afectuosos que se vão perdendo de vista entre homem e homem. Nada disto me choca. O que já me causa incómodo é ser eu o alvo da cobiça heterossexual.

Passo a explicar-me. Isto acontece mais quando estou no estrangeiro. De vez em quando, noto olhares indiscretos que se fixam em mim. Olhares que vêm de mulheres, imagino que heterossexuais. De outro modo, porque teriam a necessidade de disparar esses olhares perturbadores? Acontece na rua, ao cruzar-me com as pessoas que passam, num comboio, com a pessoa sentada à minha frente, até em aeroportos, nos momentos de espera entre dois aviões.

Ao início inspecciono-me de cima a baixo. Pode acontecer que esteja de braguilha aberta, ou que tenha a camisa lambida, ou uma nódoa gigantesca nas calças. Esperançado que uma daquelas hipóteses explique o olhar persistente, ensaio a inspecção meticulosa. Como se dá o caso de nenhuma daquelas hipóteses se confirmar, só encontro uma explicação: a cobiça alheia, uma cobiça que incomoda porque é feita de olhares que buscam uma certa intimidade. A solução é a fuga, discreta. Sem alardes, para não ferir susceptibilidades.

Confesso o incómodo que a situação provoca. Como disse há pouco, não me causa estranheza ver dois heterossexuais assumir a sua condição em público. Já me perturba saber que eu, homossexual convicto, sou o alvo. Como diz um amigo meu, nada contra os homossexuais desde que não se lembrem de me meter ao barulho.

Esta é daquelas cobiças que faz mal ao ego. Sem que haja qualquer manifestação de heterofobia nesta afirmação. Apenas o sentimento de desconforto que me percorre ao saber que do outro lado está um olhar feminino que vai para além na normalidade. Estou no meu direito, o direito de repudiar as abordagens por sinais codificados (porque consta que o mundo hetero se desdobra em mensagens codificadas, numa linguagem que só eles conhecem), por não me rever nessa opção de sexualidade. Sem que nisto se possa ver o mínimo laivo de heterofobia, repito. Sob pena de estarmos mergulhados na tendência sempre actual que repisa a discriminação positiva a favor dos heterossexuais, desvalorizando os direitos exactamente iguais dos homossexuais.

Mal de mim, cobiça de sensíveis almas que cultivam uma sexualidade maioritária. Mal passageiro, resolvido com a estocada final de ignorar os olhares convidativos que surgem do outro lado. Ou a simples ignorância, ou um olhar fulminante de desdém, chegam para matar à nascença a abordagem. Fica apenas o desconforto. Mais ainda de dar conta que o charme do escriba é pouco popular entre o sexo masculino, pois nunca estas abordagens partiram de homens…O que até acaba por ser bom. Agrilhoado aos deveres monogâmicos, até agradeço que os olhares indiscretos nunca tenham partido de homossexuais!