24.8.05

"Liga Betandwin.com" e as virgens ofendidas

A última peça da tríade do futebol, com que a semana de escritos foi começada. O pessoal do futebol profissional teve o rasgo de encontrar um patrocinador para os próximos quatro anos. Um contrato que vale dez milhões de euros. O patrocinador é uma empresa de apostas através da Internet – conceito difundido além fronteiras, acompanhando as oportunidades franqueadas pelo avanço da tecnologia.

Custa a admiti-lo, mas o Major que comanda os destinos da liga portuguesa de futebol teve olho para o negócio. E provocou um forte abalo telúrico nos interesses instalados. Assim acontece quando os monopolistas sentem que alguém vai entrar no mercado, terminado com o privilégio da exclusividade. A Santa Casa da Misericórdia e os casinos, por motivos diferentes, fizeram um ruído ensurdecedor, esgrimindo argumentos contra o contrato de patrocínio que dizem ilegal. A Santa Casa da Misericórdia escuda-se no monopólio que a lei lhe garante para as apostas em eventos desportivos. Os casinos sentem-se ofendidos porque não podem fazer publicidade em meios de comunicação social, lutando contra a desigualdade de estatuto que há-de favorecer a Betandwin.com através da visibilidade oferecida pelo patrocínio ao campeonato português de futebol.

É natural que quem beneficia de um monopólio se insurja contra a diminuição das suas regalias. É natural que se mobilizem corporativismos espúrios, redes de contactos tentaculares que procuram garantir a permanência do monopólio. Tudo isto é natural, mas ao mesmo tempo encerra o seu quê de patético. A Santa Casa da Misericórdia parece andar a dormir no ponto. Tudo indica que não sabe o que é a Internet, e que há empresas dedicadas às apostas em acontecimentos desportivos que operam exclusivamente on-line.

Basta visitar o site www.Betandwin.com. E ver que as possibilidades de desbaratar dinheiro em apostas desportivas se desdobram por mil e uma modalidades; e que são inúmeros os campeonatos de futebol, por esse mundo fora, nos quais é possível realizar apostas. O campeonato português também é oferecido. A Santa Casa da Misericórdia tem que processar a Betandwin.com, por violar a regalia de exclusividade deste tipo de jogo no território nacional. Tarefa impossível: no reino da Internet, o exclusivo da territorialidade nacional passou a ser um anacronismo. Querer perseguir a Betandwin.com por incluir apostas a jogos do campeonato português terá o mesmo sucesso que procurar uma agulha num imenso palheiro.

Os casinos também mostraram uma reacção absurda. Alegam que não podem fazer publicidade às suas actividades. Ora aqui há um equívoco de todo o tamanho, que se desmultiplica em dois aspectos. Por um lado, os casinos estão autorizados a fazer publicidade. Eles patrocinam manifestações desportivas (com destaque para o automobilismo); e os nomes de casinos aparecem nas camisolas de algumas equipas de futebol. Por outro lado, os casinos enganam-se ao escolher a Betandwin.com como alvo: operam em áreas de negócio diferentes. O domínio de actividade da Betandwin.com não interfere com os tradicionais jogos de azar dos casinos, nem estes fazem apostas sobre resultados de eventos desportivos. O que se disse em relação à queda do mito da territorialidade estende-se aos casinos: proliferam sites onde se pode perder a cabeça em jogos de azar. Julgam os casinos que podem vedar o acesso a esses sites, impedindo os portugueses de aí jogar?

A reacção é patética. Dá a impressão que casinos e Santa Casa estão de cabeça perdida, ao serem apanhados de surpresa pelo golpe de asa da liga portuguesa de futebol. Quem perde o tino, perde a razão. E quando se agarram à tábua de salvação da lei, feita para proteger os seus monopólios, esquecem-se que vivemos numa era em que a lei nada pode contra os meios (como a Internet) que galgam as fronteiras com toda a facilidade. Faz lembrar as mentes pudicas que censuram a prostituição, achando-se no império da razão devido à lei que cauciona a sua razão. E, no entanto, as casas de alterne estão por aí, espalhadas de norte a sul, mesmo nas barbas das autoridades. Expondo a sua incapacidade para cumprir a lei, revelando uma lei desfasada por não ser possível fazê-la respeitar. Os tais pudicos, esses, continuam agarrados aos seus dogmas, assobiando para o lado, fazendo de conta que não se passa nada.

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