26.9.05

E se subitamente acordássemos espanhóis?

Não sei se é “inveja”, agora que os espanhóis celebram um piloto que ganhou o campeonato mundial de fórmula um. As façanhas desportivas são ingredientes importantes do orgulho nacional. Cimentam o sentir pátrio – neste caso, dos aficionados do desporto automóvel, mas também de muitos leigos que sabem que os bólides têm um motor e quatro rodas. É um conterrâneo que se distingue no escol dos eleitos. Motivo bastante para descer à rua em celebrações que exultam a pertença nacional.

Os espanhóis são exímios na arte de pôr nos píncaros o que é deles. Rivalizam com os franceses no chauvinismo. De tanto exagerarem são irritantes: na forma como se auto-elogiam, como se acham predestinados entre os demais povos. São o contraste com o país vizinho que está enclausurado na geografia peninsular. Somos conhecidos pela falta de auto-estima. Percorremos as esquinas da vida em lamúrias, vituperando a má sorte de termos nascido no berço geográfico que a desdita nos pôs em destino. A espaços, raros momentos de arrebatamento: nesses instantes parecemos rivalizar com o fervor nacionalista espanhol. No transe momentâneo acreditamos que também fomos bafejados pelo dedo divino, que numa qualquer manifestação desportiva levou um dos nossos à glória dos vencedores.

Por todo o lado, as competições desportivas servem para cimentar os laços de pertença de uma comunidade. Os desportistas tiram o máximo que há neles, espremem as capacidades físicas, a destreza, apostam na sorte dos audazes. Fazem-se campeões. E logo a seguir tudo se passa como se os milhões de concidadãos que os apoiam estivessem na retaguarda, a dar o empurrão final que os levou aos píncaros. Os desportistas perdem o exclusivo da façanha pessoal; são obrigados a partilhá-la com os patrícios que se revêem na vitória. Que é nacional, não do atleta que suou as estopinhas.

A vitória de Alonso no campeonato de fórmula um coincidiu com o início uma competição que se diz alternativa da fórmula um – a taça das nações de automobilismo. Os pilotos são remetidos ao anonimato pessoal, pois a classificação é feita das nações concorrentes. E, contudo, quem está ao volante é um indivíduo, não a nação. Desmerecem-se os dotes de condução do piloto, que aparece em nome dos milhões que o devem estar a apoiar. Como se ali, na exiguidade do monolugar, o piloto fosse o motorista dos milhões de compatriotas.

É um campeonato que revisita o que de mais anacrónico têm os países, agora que a globalização emerge, triunfante. Somos convidados a passar uma esponja pelo passado que nos devia envergonhar – o passado de guerras em nome do orgulho pátrio, de conquistas territoriais espúrias, de inimizades sem sentido, acobertando pequenas loucuras pessoais de líderes nacionais. Quando repouso a atenção neste tipo de competições que enaltecem a pertença nacional como factor de diferenciação do outro, mais me apetece meter requerimento a pedir a condição de apátrida.

À memória vêm as teorias de sociólogos, que procuram explicar os sedimentos que alicerçam o sentir e a pertença nacionais. Para os que pensam que isto de ser nacional é como a lição de sapiência de curas avisando os nubentes que o casamento vale até que a morte os separe, li há dias algo que me deixou esclarecido do contrário:

Antes afirmou-se que as pessoas têm a tendência para escolher o que lhes é familiar, o que explica a defesa da nacionalidade. Todavia, isso não é incompatível com a possibilidade das pessoas optarem por assimilar culturas de outros países” (Glynn Morgan, The Idea of a European Superstate – Public Justification and European Integration, Princeton, Princeton University Press, 2005, página 54).

Ao ler esta frase, ao olhar para o outro lado da fronteira, detectando os feitos, a capacidade de iniciativa, o orgulho que se esvai da pertença comum, e como em trinta anos os espanhóis cresceram tanto quando há trinta anos estávamos empatados numa pobreza periférica da Europa rica – pergunto-me se não nos faria melhor um certo dia acordarmos todos espanhóis. Talvez fizesse mal àqueles que ainda vivem agarrados a uma portugalidade enterrada nos manuais da escola secundária. Seria profiláctico para o nosso bem-estar, para a materialidade dos sentidos. Com um senão: embarcarmos na arrogante superioridade que os espanhóis exibem.

Reconsiderando as coordenadas, mal por mal, antes a humilde pequenez da gesta lusitana.

1 comentário:

Anónimo disse...

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